Tom 6

[Já leu Tom nº 0nº 1nº 2,  nº3nº4 e o nº5? Mudaram algumas coisas, principalmente a partir do 4.]

Tom rapidamente chegou em casa e não tardou a dormir. A mesma euforia que o álcool o dava era retirada algumas horas depois como se fossem as muletas de sua vontade de permanecer acordado, ele simplesmente não conseguia nem queria resistir. Dormiu e dormiu pesado. Era a madrugada de uma terça-feira e ele não tinha nada marcado para quando acordar. Isso era a melhor coisa do mundo. Não importava ter que trabalhar até meia-noite, o importante era simplesmente não ter uma hora para se levantar, deixar o seu corpo descansar o quanto ele acha que merece. Isso sim é vida, ele sabia.

Mais uma vez a noite de sono não foi das mais tranquilas. Os pesadelos o atormentavam mais uma vez, ele nem sabia por que. Na verdade, não conseguia lembrar de seus sonhos na maioria das vezes. Acabava tentando não se importar com isso ou o que quer que aqueles pesadelos dissessem, mas o mal estar permanecia por bastante tempo. De vez em quando ele achava que era a ressaca, mas provavelmente era os dois.

Levantou-se. Estava meio zonzo ainda, sentia uma dor de cabeça terrivel e a sede que secou o deserto do Saara. Porém isso pouco lhe importava no momento. Tinha uma ideia na cabeça, ideias para Tom vinham nos momentos mais inusitados. O importante era correr para não perder o pensamento, pois na mesma velocidade que chegavam eles sumiam. “Nunca soube porque deveria ser assim, eu que sempre te quis perto de mim, desde pouco tempo atrás, mas que parece uma eternidade”, ele sabia que não era bom de rima. Escrevia poesia e pensava em música, de vez em quando dava certo. Nem sempre era sincero no que escrevia, na maioria das vezes não importava, por que não deixar a imaginação guia-lo e levá-lo a um mundo diferente? Parecia tão óbvio… E ele escrevia sobre amor, era o instinto mais natural, que mais mexia com ele. Raramente tinha conseguido escrever alguma coisa que fugisse disso, na maioria das vezes funcionava e estava satisfeito. Ficou feliz por conseguir escrever logo duas letras. Quando vinha não dava para ser de uma vez só. Ele chegava ao ponto de se contrazier em cinco minutos, nada de novo. A imaginação era dele e mais de ninguém.

Agora sim podia ir atrás de consertar o que tinha de errado com ele: a sede e a dor de cabeça. E o cabelo que encrespava quando ele ir dormir sem tomar banho, genética triste. Ligou o som bem alto, era um vinil de Chuck Berry, tomou um remédio para dor de cabeça, entornou uma garrafa d’água e foi para o chuveiro, onde provavelmente acabou bebendo o dobro do que tinha bebido antes. Saiu do banho dez minutos depois, renovado. Não tinha nem mais remelas para reclamar, tudo parecia perfeito.

Ligou seu computador, viu que ainda eram 10h30 da manhã. Tinha tempo de sobra para colocar as coisas em dia e trabalhar. Quando a tela acendeu, seus primeiros reflexos foram olhar algumas notificações no Facebook para ver se alguém tinha falado dele ou com ele, procurar qual era a causa humanitária do dia em que poderia ajudar curtindo ou compartilhando a imagem a troco de imaginários cinquenta centavos, abominar algumas postagens que ele achava absurdamente desnecessárias e, enfim, colocar sua próxima música do desafio dos 365 dias colocando uma música que lembrava algum momento. Ele estava no 15º dia deste desafio e sabia que não chegaria ate o final. Tampouco se importava.

Rotina social feita, hora de olhar as catástrofes do mundo nos sites de notícia. Não que isso fosse mudar a vida dele, mas de vez em quando aparecia alguma coisa que ele achava importante. O mundo continuava uma desgraça, algumas notícias amarelas tentavam fazer um contraste, e no final das contas era mais do mesmo. Olhando a parte de tecnologia, o de sempre. Alguma empresa lançando alguma coisa, clamando ser algo único, revolucionário e must-have e ele sabia que não passava do mesmo besteirol de sempre. A tecnologia em alguns momentos andava a passos largos, mas na maioria das vezes ia steady as she goes, como ele gostava de dizer. Empresas comprando empresas, parecia até que elas tinham absorvido o comportamento humano de comprar e vender coisas, mas agora era em larga escala. Em uma reunião de poucas horas em algum lugar bastante luxuoso e com uma equipe de 15 pessoas era definido o futuro de dezena de milhares.

Na verdade, Tom achava que boa parte desse sistema estava errado. Não que as empresas não devessem comprar e vender outras empresas menores, mas estava tudo supervalorizado. Parecia que até os grandes presidentes, CEOs, CFOs, e outras siglas chiques, estavam caindo na lábia do produto único e revolucionário, super-ultra-mega-blaster tampa de crush. Davam milhões ou bilhões para coisas que não pareciam fazer muito sentido, até um site de receitas entrou na lista dos controlados do Google pela bagatela de alguns milhões. Tom imaginava o quão felizes deviam estar os fundadores. Era o suficiente para passar a vida sem stress algum. Não que isso fosse acontecer, pois na semana seguinte os caras estariam com alguma ideia e logo logo teriam um zilhão de problemas pra resolver, gastariam boa parte do que tinham ganho para uma tentativa de criar outro negócio que dê certo. Mundo louco, ninguém sabia aonde ia parar ou quando aquela bolha da criação em excesso ia acabar, nem Tom.

Sua barriga roncava e ele não tinha paciência de cozinhar hoje. Mandou uma mensagem para Jameson, seu grande amigo. Era Alice, a anjinha, de um lado, e Jameson, o diabinho, do outro. Os dois tinham tudo para não se gostarem, mas no final das contas acabavam se completando e sendo grandes amigos para Tom. “Brother, estou faminto. Numa ressaca do cão e sem paciência para cozinhar. Vamos comer alguma coisa?”. Jameson, outro compulsivo por tecnologia, logo respondeu “Com certeza! Saio da obra em 20 minutos e vou te pegar, pode ser?”. Ele era um engenheiro bem sucedido. Provavelmente ganhava o dobro de Tom e gastava quase tudo. Ele sabia curtir a vida, Tom adorava isso nele. Foi vestir-se para esperar seu amigo. Sempre pegava carona com ele, evitava dirigir porque sabia que não bastava ser um desastre no volante, também não tinha paciência para o trânsito. O assento do copiloto era seu lugar.

Tom

Já leu Tom nº 0, nº 1 e nº 2?

O sono veio fácil, mas o problema foram os sonhos. A tempestade de pensamentos que tinham ocupado a cabeça de Tom esses dias ainda não tinha se dissipado. Porém, parecia que o tempo ia melhorar. Ele viu que podia dar a volta por cima e recuperar o bom humor e o prazer pela vida.

Tom acordou e, instintivamente, foi olhar o seu computador. As pessoas achavam estranho quando ele contava desse hábito, mas era algo tão comum e óbvio para ele: lá tem as horas, as notícias e tudo que lhe interessava ao acordar. Viu que eram quase 10 horas da manhã, o seu horário comum de acordar. Tomou banho, escovou os dentes, ligou o som e começou a trabalhar. Ele ignorava o café da manhã, pois não gostava muito de pão, ovo e essas coisas que se comem no desjejum. Por isso, preferia acordar mais tarde e só se alimentar entre as 12 e as 13 horas.

Ele raramente sentia que seu trabalho era entendiante, afinal era o que ele gostava de fazer, mas, excepcionalmente, não estava nem um pouco a fim de fazer uma análise sobre a eficiência da campanha publicitária da marca X de bebidas. Sua cabeça estava em outro mundo. Tom queria voltar à Ovelha Negra e conhecer aquelas meninas que se divertiam tanto sem se preocupar com os problemas da vida. Talvez elas soubessem a solução para uma vida mais feliz, talvez elas só estivessem expondo um lado da história. Tudo isso era um grande enigma para ele, mas que lhe dava muita vontade de decifrar.

Apesar de sua cabeça se revirando e estando bem mais a fim de pensar mais no fim do seu namoro, Tom era profissional. O que lhe fez ter uma clientela fiel foi sua qualidade. O que lhe fez não ganhar dinheiro foi a sua falta de capacidade em saber como ganhar dinheiro com seu trabalho. Fazia algo que gostava e executava com maestria, mas não sabia a melhor forma de ganhar dinheiro com isso.

Ele sabia que não tinha muito para onde correr, tinha que trabalhar e focar sua cabeça no seu ganha-pão. Continuou fazendo suas pesquisas pela internet e anotando resultados de várias ações publicitárias que foram iniciadas há pouco tempo, mas que necessitavam de resultados, seja para impressionar os chefes, seja porque as ações realmente necessitavam ser mensuradas com tanta velocidade. Não importava para ele, já tinha virado rotina, era só coletar as informações e manter relatórios.

Certo momento, recebeu uma mensagem de Roberta, uma analista de marketing de uma das empresas para a qual Tom fazia seus freelas. Era do jeito que o agradava e que ele mesmo achava que merecia, pois também tinha seus defeitos. Do mesmo jeito que amava música, era quase uma extremista xiita em relação a gêneros musicais. Pouca coisa era pura para ela. Adorava livros, odiava escritores muito mainstream, como gostava de chamá-los. Se o blues, o rock e a música clássica eram os deuses, a música eletrônica e o pop comercial vinham do inferno. Se Dostoiévsky, Fante e Bukowsky eram os reis, J.K. Rowling, Dan Brown e Stephenie Meyer eram aqueles que tentavam destruir o império do conhecimento e do bom senso. Ao mesmo tempo em que seu corpo e sua face transmitiam uma aura gentil e suave, sua personalidade muitas vezes imponente não agradavam a Tom. Ele odiava extremismos.

Quando se conheceram, há quase um ano, a personalidade retraída e mistériosa do analista de mídias sociais quase eremita a atraiu por ser bastante intrigante. Infelizmente, para ela, ele não a deu muita atenção, pois estava num relacionamento com alguém de quem gostava muito. Infelizmente, para ele, Roberta gostava de atingir seus objetivos e demorou para desistir de falar com Tom. Só parou mesmo quando entrou em um relacionamento conturbado com seu ex-chefe, que a tinha cortejado desde que era estagiária. Os meses de insistência fizeram com que Tom pudesse entender a personalidade agitada e imponente dela, mas não era o que ele buscava no momento. Queria paz e futuro com sua namorada.

Hoje, Tom estava solteiro. Há pouco tempo, verdade, mas solteiro. A mensagem que estava no seu smartphone era provocante, mas não podia atender tão urgentemente o chamado, pois tinha que finalizar um relatório justamente para a empresa de Roberta. Ela queria marcar um café com ele, retomar as conversas que tinham parado há vários meses. Agora, os dois estavam solteiros. Tom tinha visto no Facebook dela. A vida social agora tinha seu próprio outdoor. Se chamava rede social, o lugar onde você exibe o que quer, mas muitas vezes não percebe quando passou do limite entre o pessoal e o privado, que deveria ser reservado para o mínimo de pessoas possível. Era a sociedade do exagero, da fama e dos holofotes. E certa parte desta história era o trabalho de Tom, o que o levava sempre a pensar quais motivos faziam as pessoas se expor tanto. Respondeu a ela dizendo hoje não dava, quem sabe amanhã?

Continuou trabalhando e, ansioso, pensava em qual seria a resposta dela. De vez em quando só se tem uma chance.

A Orkutização do Twitter

A gente tá vivendo uma parte da vida digital em que acontece a Orkutização do Twitter. Hoje em dia, o que você mais vê é pessoas implorando para terem seguidores, mil e quinhentas promoções que seus amigos participam e só fazem lotar a sua timeline e spam, muito spam. Principalmente de vírus [nada mais comum], mas também spam de bandas. Por que diabos eu iria ouvir uma banda que quer me obrigar a dar atenção a ela? Que boa impressão isso traz pra mim? Quem é que gosta de uma banda que fique enchendo o saco sem pedir permissão? Então morre, diabo!

Mais outra, o que significa você ter 2000 seguidores no Twitter, 3000 amigos no Orkut, etc.? O que você ganha com isso? Para aí e reflete a diferença entre 100 e 2000 pessoas lendo a merda que você posta no dia a dia [ah, caiu a ficha por que você não tem tantos amigos? É verdade, ou você usa moderadamente o twitter ou você é um motherfucker que fica implorando seguidor e não coloca nada de útil, sacou?], a diferença é nenhuma. Eu, com meus quase 500 seguidores [sendo 300 deles spam/lojas/gente que segue todo mundo e eu não tenho a mínima ideia de quem seja], mal noto a diferença entre quando eu tinha 100, 150. Isso porque você sempre vai ter seu core de amigos e são eles que fazem as coisas importarem, o resto é resto.

A Orkutização do Twitter veio do fato de que agora o Twitter é modinha. 1 ano atrás [parei agora de escrever porque chegou um email, oba! Fui ver: Club da Parceria está lhe seguindo no Twitter. Que bom, soma aí mais 1 seguidor e mais 1 loja me seguindo, jurando que eu vou seguir de volta] poucos tinham aderido ao passarinho azul, desses poucos, 10% usavam com uma frequência satisfatória. Agora que todo mundo tá lá, inclusive as grandes estrelas nacionais, internacionais e virtuais [é, tem gente que virou famoso por causa do Twitter, viva as web-celebridades!], tá rolando uma grande imigração pro Twitter no mesmo esquema de quando rolaram as políticas de inclusão digital e a galera descobriu o Orkut. É lógico que acaba tendo um certo preconceito, mas não estou argumentando sem razão. A cultura dessa galera latecomer é diferente dos ‘pioneiros’ [aqueles que vivem em redes sociais, trabalham com isso, etc. e os formadores de opinião], que por sua vez é diferente dos que chegam num segundo momento e assombrosamente diferente dessa galera que chega por último, quase que num processo de expulsar os pioneiros para que eles vão procurar alguma outra rede social por não aguentarem a cultura dessa galera nova.

Hoje, a moda é o Facebook. É moda, mas ainda não chegou nem um pouco perto do pico que um dia vai ser, mas vocês vão ver: já passou a 1ª onda [dos pioneiros], estamos na 2ª onda [o segundo momento] e daqui a uns meses chegam os latecomers. Por que eu acho que talvez os pioneiros não saiam do Facebook com tanta facilidade? Porque o Facebook é global. Apesar de num futuro próximo a experiência ao usar o Facebook piore bastante porque muito ‘amigo’ seu só vai fazer te mandar spam, convidar pra festa desinteressante em que o cara provavelmente é promoter e tal, não vai ser tão fácil de se desprender. Eu mesmo fico lutando com minha consciência para deletar minha conta no Orkut. Já pensei várias vezes, mas ainda tenho muito amigo meu por lá que ainda não chegou no Facebook e eu não quero perder contato [nem minhas fotos, tenho que tirar um dia pra sair salvando uma por uma]. Mas será que eu uso o Orkut como usava 2 anos atrás? No way, cumpadre. Quando chega ‘scrap’ [que nem chega mais hoje em dia], eu vejo pelo email se é algo interessante, se merecer resposta eu entro lá e respondo, mas para mim não serve para nada. 95% das pessoas interessantes para mim já estão no Facebook, a minha home do Orkut só tem spam, para que eu vou entrar?

Um dia eu cometo Orkuticídio, prometo.

Ugo.

Mayer Hawthorne – A Strange Arrangement [soul moderno, vai no Youtube e confere as músicas, é massa.]

Tenho pena dos anti-sociais.

Hoje em dia, a gente vive num mundo que cada vez mais vai se transformando num ambiente virtual. Desde a revolução causada com a popularização da internet, a gente vem observando novas e mais novas tecnologias sendo criadas e mudando nossa forma de viver.

Esse ‘ambiente virtual’ em que boa parte das pessoas está vivendo chama-se Web 2.0. Nela imperam as redes sociais e a interação de empresas, bandas, artistas e todo o naipe de seres que eram antes ‘intocáveis’, com o público. Hoje se vê a galera de Hollywood usando twitter [usando até pra acabar relacionamentos, olha até onde já baixou o nível aehueahuahuae], o povo das bandas da moda tá aí no fotolog e no orkut falando com seus fãs e tudo isso é muito lindo, e eu faço parte disso também.

Maas, e nossos colegas anti-sociais? Até alguns anos atrás, eu me considerava um anti-social. Não por não fazer parte das centenas de redes sociais que existem atualmente [até porque nessa época a gente ainda não vivia o boom das redes sociais]. Eu vejo que os coitados estão rodeados de pessoas que participam de vários ciclos sociais, seja um pra fotos, seja outro pra vídeos, mais um pra falar da vida, outro pra reclamar da vida, outro pra dizer o que tá fazendo na vida, outro pra dizer o que está ouvindo enquanto se vive a vida, etc etc etc. Aí os coitados, que nenhum interesse tem [o circunflexo caiu, que droga ¬¬] na vida dos outros, observam o oba-oba sem saber o que fazer. Alguns querem pelo menos demonstrar um pouco de sociabilidade e saem seguindo a onda, mesmo que nunca entendam o por quê de estarem fazendo isso e nunca levarem nenhuma das redes a sério. Outros acabam por ignorar tudo, afinal são anti-sociais ferrenhos que só mantém o orkut [opa! os anti-sociais tem orkut sim! porque hoje em dia, ter orkut, no Brasil, não é questão de ser social ou não, é questão de existir! se algum amigo não tem orkut, ele simplesmente não habita o mesmo ambiente que nós.] e o seu MSN, ainda que não entre quase nunca e, no momento que tá lá online, não puxa conversa com ninguém e fica rezando pra não puxarem conversa com ele, já que o objetivo de ficar online é só dizer que existe e é, no mínimo, um pouco social. Complexo isso, não?

É esse o problema dos anti-sociais. Antes chegar na sua escola/faculdade/trabalho calado e sair mudo já era o bastante pra ser anti-social. Hoje em dia, se você quiser provar que É anti-social, o pré-requisito é EXISTIR. E, para existir, é necessário fazer parte de uma rede social.

E aí lascou. Como enfrentar esse dilema?

Ugo.

Kaiser Chiefs – Yours Truly, Angry Mob [o melhor cd deles]