Valladolid .7

Fazia tempo, heheheh.

A semana passada foi bem corrida. Primeiro porque comecei a ir às minhas aulas, segundo porque tive que trocar várias vezes as cadeiras que vou fazer porque não eram aceitas pela FCAP. Inferno total isso, argh. Ainda mais porque a mulher da universidade estava infernizando minha vida para eu fazer minha matrícula com o DNI [o RG espanhol]. Meu pai teve que encher o saco do consulado  para conseguir que minha certidão de nascimento não demorasse tanto que eu não conseguisse me matricular na faculdade e no final das contas está tudo dando certo. Provavelmente a certidão chega aqui na quarta e eu consigo fazer meu DNI.

A semana não teve muita coisa nova. Fui na segunda para o Tandem, que é um evento de “language exchange” em que os intercambistas ficam conversando e trocando vocabulário de seus países. É bem legal, mas eu ainda estava doente e voltei para casa um pouco mais cedo. No resto da semana as coisas foram mais ou menos as mesmas. Faculdade, curso de espanhol e casa. Saí na quarta pro Juanita, foi legal, mas mais uma vez a gripe incomodou. Quinta e sexta fiquei em casa, quinta porque queria descansar e não sair no meio da madrugada no frio que faz aqui, e na sexta porque no outro dia eu ia viajar para Segóvia bem cedinho.

Bem que eu poderia ter desistido de ir para Segóvia, não tinha acordado lá muito bem, mas whatever. Dinheiro tinha sido dado e não tinha volta, então vamo que vamo. Pegamos o ônibus, em uma hora de viagem já chegamos em San Ildelfonso, um pueblito que é famoso pelo palácio de La Granja, uma residência da família real espanhola, principalmente no verão. O lugar é muito bonito, realmente. Tivemos uma guia contando a história do lugar, mas nada muito especial. Ela falou para que era cada um dos muitos quartos que tem por lá e explicitou a quantidade de luxo e frescura dos reis, rainhas, príncipes e princesas. Nada que me interessasse muito.

Depois de sair do Palácio, a gente foi no jardim, que é bem mais bonito e não inspira tanto a extravagância real, embora seja fruto dela. Obviamente, as coisas não estavam tão bonitas, porque, apesar de fazer um sol massa, era inverno e as árvores não tão lá muito bonitas. Entretanto, valeu a visita. Depois fomos a Segóvia propriamente. Chegamos lá e procuramos algo para comer, era a prioridade. Infelizmente, acabamos comendo kebab por causa da indecisão geral que demoraria anos para ser resolvida. Teve gente que foi comer os Lechazos [acho que são leitões] que são famosos por lá, mas disseram que a porção era pouca e não matava bem a fome. Comemos, enchemos o bucho e partimos. Faltava mais um lugar para ir: el Alcazar de Segovia

Jardines de La Granja

O Alcazar de Segóvia é uma fortificação feita com a intenção de defender Segóvia de quem que estivesse atacando. Fica localizado num penhasco, dando uma visão muito massa do vale. O Alcazar serviu também de residência real, prisão e academia militar. Infelizmente, para nossa viagem, houve um incêndio há uns 140 anos e que destruiu muita das coisas originais, com o guia falando sempre que a maioria do que tinha por lá era réplica. Tira um pouco do gosto da história. Depois do blábláblá do guia, fomos para a torre, que é o lugar mais alto do Alcazar. A escada que leva até lá realmente não foi projetada para um lugar histórico, e sim para uma fortaleza onde lá em cima teria uns 3 ou 4 guardas de vigia. Mal dá para passar uma pessoa subindo e outra descendo, é realmente muito estreito e um prato cheio para os claustrofóbicos. Foi um saco a subida, outro saco a descida. Se bem que, por lá, a visão realmente era muito legal, o chato mesmo era o despreparo do lugar para tantos turistas, imagino no verão como deve ser.

Depois disso, voltamos para Valladolid, numa viagem regada a muitos roncos. Quando chegamos, o povo já estava marcando um Pub Crawling [sim, eles não param] e eu mais uma vez tive que recusar por falta de condições físicas. De noite, encontrei a neosaldina, uhul! Tomei uma perto da hora de dormir e não senti muita diferença. No domingo, tomei outra e, faltando 40 minutos para o basquete, mais uma. Resultado: reação alérgia a dipirona, minha pele cheia de manchas. Ainda bem que essa foi a reação alérgica, hehe. Deu para jogar com a galera lá por uma hora e meia e depois voltar para casa, com o pulmão uma merda, mas tudo bem. Descansei o resto da noite, recusei sair de tapas [sair para comer entradinhas ‘tapas’ em alguns bares] e fiquei em casa.

Hoje, acordei, resolvi minha bronca na prefeitura com certa facilidade [precisava de um documento para dar entrada no DNI], peguei um ônibus que passa lá perto de casa, mas que até onde eu desci dele junto com todos que dentro estavam, não passava nem por perto. Tá bom que eu o vi dobrando no sentido correto depois, mas a merda já estava feita. Andei uns 15 minutos até em casa, deixei minha bolsa [a intenção era pegar mais dinheiro, mas acabei esquecendo] e fui na farmácia. Lá a simpática farmacêutica [sim, quem trabalha em farmácias aqui é formado, não é aquela bagunça de Recife que vez ou outra se encontra alguém meio ‘perdido’ por lá],  ia me vender paracetamol [que não tenho alergia], mas me ofereceu um brother aqui chamado Frenadol. É um complexo de um bocado de coisas que no final das contas parece Cebion com paracetamol. Ele é granulado, então você tem que botar num copo e botar água, feito as vitaminas C. O gosto é similar, mas bem mais azedo. Espero que funcione. A bronca é que só tomei 2 hoje e amanhã não tomo por causa de Salamanca. Quarta eu volto ao tratamento.

Provavelmente, quarta eu volto ao blog também.

Ugo.

The Mighty Mighty Bosstones – Live from the Middle East

Tom 4

[Já leu Tom nº 0nº 1nº 2 e o nº3?]

Finalmente o trabalho havia acabado. Por sua falta de concentração ele tinha demorado mais que o normal, afinal não era todo dia que ele acabava seus relatórios às 20h. Tom estava cansado e estava bastante de saco cheio por causa do dia que tinha tido. O que deu ao seu dia um mínimo de interesse foi a troca de mensagem com Roberta, que acendeu uma esperança de ter alguém que não fosse Alice para lhe confortar. Sabia que inicialmente esse café, se aceito por ela, provavelmente os levaria a um caminho que Tom julgava bom para ele nesse momento. Nada melhor para esquecer o seu perturbado fim de namoro do que o corpo macio e a personalidade contrastante de Roberta.
Entretanto, ela demorava em responder à mensagem. Já tinha passado mais de uma hora desde que Tom havia enviado e nenhum sinal de vida por parte dela. Ele tampouco ficaria em casa olhando para o seu celular e esperando que ela respondesse. Decidiu descer e ir à Ovelha Negra. Nada como uma cerveja para relaxar depois de um dia de trabalho. Andou menos de 2 minutos e já estava na porta do bar. “Puta merda, hoje é segunda-feira. Qualquer lugar aqui estaria fechado, menos a Ovelha Negra, ufa.”
Dessa vez, ele se sentou no balcão do bar. Estava sozinho, não esperava ninguém, só queria descansar. Não era dia de embriagar-se, não era dia de fazer nada, só matar o tempo. Falou com Joab, o bartender, e pediu a habitual cerveja. Gosto amargo, garrafa verde, extremamente gelada. Ele não poderia querer mais nada. Sacou seu celular e fez o habitual check-in no foursquare. Não era só a maneira de dizer a todos seus amigos onde estava, mas também tinha a ver com o orgulho que tinha de segurar a posição de “prefeito” do Ovelha Negra, ou seja, a pessoa que mais esteve no local. Tomou um gole de cerveja, estava estupenda.
Quase uma hora tinha se passado e Tom só tinha feito beber e conversar com Joab e Reginaldo. Conheceu Joab ainda quando era adolescente e ele trabalhava como garçom num restaurante que ficava num shopping center perto da casa de Tom e que ele e seus amigos costumavam ir porque ofereciam uma fonte infinita de refrigerante a um preço irrisório. Enquanto isso, Joab era o garçom mais gente fina da casa e o preferido da turma. Sempre simpático e com um gosto musical bastante apurado, ficava conversando com os então-garotos por vários minutos, até ser chamado por sua sempre furiosa gerente. Velhos tempos, Tom lembrava.
Reginaldo não tinha muita história. De família pobre, saiu da escola para trabalhar e desde então sua vida era passada dentro de bares, servindo os clientes, e na rua, ganhando uns trocados extras vendendo cerveja e refrigerante em dias de festa. Desde sempre gostou de música e de cantar, tinha tido um grupo de pagode com seus amigos e suas habilidades lhe renderam um emprego de garçom-cantor num prestigiado bar da cidade. Lá trabalhou por bastante tempo, até que estava velho e ser demitido sem pena pelo seu chefe. Juan, o dono da Ovelha Negra, sobe aproveitar a oportunidade e o chamou para ser o chefe dos garçons, que Reginaldo sempre falava maître, palavra que tinha aprendido no outro bar. Era um orgulho para ele ter um emprego com o nome francês.
Tom não percebia que estava elucubrando sobre isso e olhou atentamente para os lados procurando alguém que tivesse visto seu momento de transe pessoal. Não, ninguém queria saber de Tom, até Joab estava bastante ocupado com os clientes que haviam chegado recentemente. Talvez todo esse flashback nem tenha durado tanto. Enquanto enchia mais um copo, foi surpreendido com a figura que havia se manifestado ao seu lado. Roberta estava lá, e sem perder muito tempo foi começando a conversa: “Preciso conversar com você”. Tom, espantado, disse: “Boa noite para você também, eu estou ótimo, meu dia não foi tão legal, mas minha noite está sendo, sente-se..”. Ela quase sempre evitava as formalidades. Sabia que todos sabiam, achava que não eram necessarias. Pouco sabia que muitas vezes um pouco de delicadeza ajudava bastante a gerar empatia.
“Tom, acabei o meu namoro.”. “Tá.”. “É serio. Ele era um canalha.”. “Novidade…”. A conversava não impressionava Tom. Era muito previsível, não era o que ele queria. Desde sempre o que lhe atraía eram coisas novas, desafios nunca propostos e a possibilidade de fugir da rotina. Não conseguiu isso da maneira que queria, tanto no trabalho, como nesta conversa com Roberta. Porém, ele tinha paciência e não tinha outro lugar para ir. “Não sei porque comecei. Todo mundo no trabalho pensava que era só para ser promovida. Você sabe que eu nunca fui disso!”. Ela estava bastante agitada, era fácil de ver. E tambem estava falando a verdade, Tom sabia. “Eu sei, eu sei. Fica tranquila que você não só é muito boa no que faz, mas também nunca fez nada de errado nesse sentido. Não tem pra que se estressar com isso.”. “É, mas por que diabos fui me envolver com ele? Não era a beleza dele que me atraía, mas tampouco era o poder. Eu não queria ficar com ele para me achar mais importante, você sabe que eu tenho problemas respeitando a hierarquia.”. “Eu sei, Roberta…”. Tom sabia, era verdade. Mas quando abria a boca não era para dizer alguma coisa marcante que fosse mudar o rumo da conversa. Era apenas para fazer com que ela desabafasse, técnica que aprendeu com Alice ao longo dos anos. E funcionava sempre, sem dúvidas. “O que eu faço agora, Tom? Tenho tanta raiva desse maldito que não consigo mais nem ir trabalhar em paz, pois tenho que olhar para ele. E pior que eu amo o que faço!”. Ela estava visivelmente abalada. Tom não hesitou em chamar Reginaldo e pedir uma cerveja gelada e uma dose de tequila para a moça. A conversa, apesar de previsível, não era o que ele esperava. Em sua imaginação seria algo entre uma booty call e uma abordagem agressiva dela nele. Sentia pena, entendia seu lado. A melhor maneira que ele achava de tratar o caso era suprimindo a dor. A tequila diluída na cerveja iria ajudar no impacto inicial. Depois disso era só dar tempo ao tempo.
Roberta foi bastante condescendente, ela não sabia o que fazer, nem o que esperar da noite. Só queria alguma coisa diferente para pensar da vida, ficar sozinha em casa não era remédio, suas amigas não eram a ajuda que ela precisava. “Beta, fica tranquila que o tempo passa e as coisas se organizam, acredite em mim, você não sabe o quanto estou sofrendo também. Marina era… ah, você sabe, ela era muito importante para mim. Mas foda-se! Vamos ser felizes!”. Roberta não entendeu no primeiro momento a mudança de discurso dele. Repentinamente, o rapaz estava em pé e se dirigia ao Karaokê que Seu Juan tinha colocado lá e que só funcionava às segundas e quartas. Demorou um pouco até ela realizar que tinham cinco garrafas de cerveja debaixo da mesa de Tom. Ele realmente não conseguiria se preocupar muito com os problemas da vida do jeito que estava. Ela estava longe de desejar isso a si própria também. Pediu a Reginaldo mais duas doses de tequila e uma cerveja. A noite só estava começando.

Valladolid .6

Integration Weekend, te quero de novo. Acabei de passar um dos melhores fins de semana da minha vida, mesmo com quase nenhum luxo e com uma gripe do além. O fim de semana começou com uma ‘viagem’ [30 minutos de ônibus para mim é menos que ir para a faculdade em Recife..] para Duenas, um pueblito onde fica o albergue onde nos hospedamos. Do meu lado no ônibus, Monika, uma lituana que eu não conhecia e que mostrou ser interessada em artes, cinema e gostava de ouvir singing poetry, alternativo demais para mim. Gente fina ela, o país da coitada tem 3,3 milhões de habitantes, enquanto a Região Metropolitana do Recife tem quase 3,7 milhões, apesar de obviamente a densidade demográfica ser mínima. O translado passou num instante, até porque não tinha como não, o lugar é muito perto. Quando chegamos, ajudamos o povo da organização a descarregar as coisas e fomos escolher nossos quartos. No melhor estilo albergue, cada quarto devia ter uns 10 beliches, coisa que normalmente eu não gostaria, mas foi legal para o povo ficar conversando e se enturmar mais.

Arrumação feita, voltamos para o salão principal, onde aconteceram as festas, o karaokê e outras brincadeiras, e fizemos uma dinâmica para conhecer as pessoas que estavam lá, já que eram 70 e provavelmente cada um conhecia a 10 no máximo. Para isso, fomos divididos em seis grupos, ficando eu no grupo 1. Aconteceram algumas brincadeiras para que conhecessemos uns aos outros e decorássemos os nomes uns dos outros. No meu grupo, José Luis era o coordenador, tinha um americano chamado Abraham, uma francesa chamada Annelore, uma outra chamada Federica, uma eslovaca chamada Katarina, um italiano chamado Nico, uma inglesa chamada Helen, um português chamado Luís, outra inglesa chamada Frankie e uma […] chamada Daniela, que não lembro direito de onde ela é, mas creio que seja da Polônia.

Depois da integração, as pessoas foram se arrumar e conversar um pouco. Eu fiquei com José Luis e Eduardo [dois que fazem parte da organização da ESN – Valladolid, não são uma dupla sertaneja] e fomos arrumar o som da festa. Som muito massa, com tudo que era necessário para fazer uma festa massa. Obviamente que ia faltar algum cabo para complicar a história, mas eu tinha minha bolsa mágica de adaptadores. Quando chegamos na sala de jantar, fomos os últimos, Juan pediu uma salva de palmas para o ‘auxiliar técnico e dj’ Ugo, que ficou um tanto quanto envergonhado, mas bola pra frente, hora de jantar. Para falar a verdade, não lembro o que jantei. Acho que era macarrão carbonara e depois serviram almôndegas. Ou isso foi o almoço do outro dia? Who cares.. Pois bem. Eu tava um pouco doente essa hora, mas depois de comer melhorei um pouco [vale ressaltar que tomei uma neosaldina também].

Quando fui me arrumar para a ‘Pijama Party’, tinha um bocado de gente conversando no quarto e depois a maioria sumiu. Acabei de me arrumar e fui procurar onde tava o povo. A sala de jantar tinha virado um cassino, quase, a única diferença era que não se jogava por moedas, se jogava por bebidas [shots]. Tinha uma roleta de shots e várias brincadeiras diferentes por lá. Esse esquenta demorou uma hora e meia mais ou menos, tempo que passou rapidamente por causa de tanta diversão. Eu ‘dei a sorte’ de cair um shot de Absinto [do forte] para mim. Não sei se foi o shot ou alguma outra coisa, mas desde então o mundo ficou mais alegre, sorridente e a minha dor de cabeça/garganta tinha dado trégua. A festa foi massa, toquei de 1 da manhã até umas 5 e meia, 6 horas. Reconheço que estava um tanto quanto embriagado, o que me fez tocar algumas coisas inusitadas, a exemplo de Ivete Sangalo e Alejandro Sanz cantando Corazón Partío, mas dane-se, acho que a galera gostou. Depois disso, obviamente, cama. Energia era zero.

Acordei no outro dia com fome, sede, dor de cabeça, congestionamento nasal e o diabo a 4. Quem disse que eu me importava? Sofri feito um condenado até sair à quadra e jogar um pouco de basquete com a galera [isso mesmo, quase morrendo fui jogar basquete. Pode chamar de secura ou heroísmo, depende do ponto de vista]. No começo a gente ficou só arremessando a bola sem compromisso, mas quando chegou mais gente decidimos fazer uma partida. Como eram 2 homens e 2 meninas contra um time de igual composição, não imaginei que teria algum problema eu jogar de óculos. Claro que tinha, né? Mutley tá aí pra isso. Na tentativa de fazer uma cesta entrei em contato com Kris, um belga de uns 1,90m e o cotovelo dele, eu creio, bateu nos meus óculos, que entortaram um bocadinho. Azar do cão, fui tirar os óculos e ficar de lente.

Deu a hora do almoço e nos reunimos na mesma sala onde jantamos e fizemos a jogatina na noite anterior. Almoçamos alguma coisa, aí sim creio que foi carbonara + almôndegas, e logo depois nos chamaram para uma sessão de chill out / massagem na sala de televisão. Foram umas 25 pessoas dessa vez. Acho que ninguém lá sabia que eu era razoavelmente bom fazendo massagem, mas acabei me juntando a Federica, a francesa do meu grupo. Quando acabei o ‘serviço’, ela disse que foi a melhor massagem da vida dela [pontos pra mim!] e depois retribuiu a massagem. Depois disso, começou uma música de relaxamento e ficamos lá dando um cochilo até umas 4 ou 5 da tarde. Quando me levantei de lá, fui jogar basquete de novo [a secura tava grande!], dessa vez de lentes. Durante isso, também fizeram um karaokê no salão de festas, onde a galera cantou música do mundo todo. O povo ficou conversando um tempinho até dar a hora do jantar. Comemos e fomos nos arrumar para a seguinte festa, a festa do branco, onde todos, obviamente, estavam vestidos com algo branco [a tirar por algumas pessoas sem muita noção]. Dessa vez, depois do jantar eu estava mal de novo. Decidi tirar um cochilo de meia hora, que inteligentemente ampliei para ser um cochilo de quase uma hora. Depois, o esquema foi o mesmo, se arruma, esquenta-cassino e depois festa. A diferença dessa vez foi que eu no meio da noite passei o comando para Pajares, outro coordenador da ESN, e fui aproveitar a festa merecidamente.

No outro dia, menos ressaca [estava mais doente, bebi bem menos] e o mesmo inferno nasal que me acomete até hoje [e que tudo indica que amanhã estará dando tréguas]. Tomei café da manhã, conversei um pouco e fui jogar mais basquete. Almoço, massagem/chill out no mesmo esquema. Fiz massagem em Marta e Sara, duas espanholas, e em ser estranho. Quem é ‘ser estranho’? Não sei. Eu falei primeiro com ela na primeira festa, mas não lembro seu nome de lá. Tampouco lembro de onde ela é. A única coisa que sei é que ela não fala quase nada de espanhol. O pior é que ninguém sabe direito quem é ela ou o nome dela. Não sei nem quem são os amigos dela porque ela não tinha um grupinho fixo. Resumindo, ser estranho. Como eu nunca nego massagem, ela fez em mim e eu retribui. Durante isso, ri demais com uma grega louca que estava lá. Ela é meio transtornada da cabeça. Fez uma massagem em Eduardo [o mesmo que me ajudou a ajeitar o som] em que dava uns tapas muito barulhentos e fazia a galera rir horrorres. Depois que as coisas se aquietaram, mais cochilo. Quado acabou o chill-out, já era hora de arrumar as coisas para ir. Não sem antes jogar uma partida de basquete contra Andrés, um amigo do México. Ele ganhou por 7-5, mas o jogo foi divertido. Depois disso, ônibus para Valladolid, onde voltei mais uma vez conversando com Monika. Chegando na Plaza de la Universidad, me despedi da galera e fui para o antro da salvação: o Jardim de Istambul. Kebab de jantar [a vontade de cozinhar ou preparar algo definitivamente não existia em mim] e me fui para casa. Guardei as coisas [estou com um bocado de roupas sujas que venho lavando desde ontem] e fui dormir.

Assim acabou um dos melhores fins de semana da minha vida.

Ugo.

Franz Ferdinand – Tonight

 

Psycho

É assim que eu chamo mentalmente minha querida/odiada companheira de apartamento. Abelin, a francesa que divide o ap junto a mim e a Mària, é um ser a parte, tão atípica que eu acabo me identificando com ela, embora em vários momentos discorde do comportamento dela.

Assim como eu, ela passa quando está em casa tá vendo seriados e só sai do quarto para ir no banheiro ou na cozinha, voltando o mais rápido possível. Uma coisa que eu faço também, porém com um detalhe: quando alguém passa na minha frente eu dou um hola, enquanto ela só fala se requisitada. Ela tem uma certa obsessão por limpeza e organização que tem seu ponto forte: ela organiza as coisas da cozinha, embora faça algumas coisas sem avisar, como por exemplo tirou minhas coisas de uma prateleira que devia ser dela e colocou numa prateleira vazia. Não vi nada contra isso, até porque o motivo era bem óbvio, mas o que custava ter me avisado que tinha colocado?

Quando eu cheguei em casa do Integration Weekend [cujo post deve sair hoje ainda], tinha um papel pregado na geladeira informando como era a limpeza da casa, com ela dizendo que era semanal e a cada semana uma pessoa faria a limpeza. Por mim tá beleza, se a senhorita disse…

Ela é estranha e é muito na dela. A eslovaca disse que ela só anda com as amigas francesas dela e já recusou vários convites para sair.

Ser estranho, mas inofensivo. Acho que vai custar muito para que eu pare de chamá-la mentalmente de psycho.

Ugo.

Edward Sharpe & The Magnetic Zeros – From Below

Valladolid .5

Pois bem, o fim de semana foi um total zero a esquerda na minha vida. Acordei no sábado la pra meio dia, Joh foi lá na residência, almoçamos e ele foi embora porque tinha que pegar o avião pra Barcelona. Passei o dia todo em casa, dormi, acordei no domingo, passei  o dia todo em casa, blá blá blá, dormi de novo.

Segunda-feira, recomeço de correria. Fui no ministério da integração tentar tirar minha carteira de saúde europeia, levei mais um fora da mulher lá e fui procurar uma solução alternativa para poder me matricular na faculdade. Acabou que tive que fazer um seguro privado, mesmo sendo espanhol e tendo direito ao sistema de saúde, né foda..

Teoricamente era para eu ter me mudado na segunda de tarde, mas quando cheguei lá, de mala e cuia, não tinha ninguém em casa e a minha atual companheira de piso não atendia o celular. E aí? Liguei para Rafa e deixei minhas coisas na casa dela. Fui para a primeira aula de espanhol com Bela. Chegamos lá e nossa professora era Raquel, uma cantabriana muito engraçada que já tinha cativado a gente desde o dia do teste de nível. A bronca era que na lista que divulgaram eu estava como aluno do Intermedio 1, enquanto as professoras tinham me dito que eu era Intermedio 2, a sala que estava no momento. Pedi para ela olhar isso e ela ficou de me dizer um dia depois. Depois da aula, finalmente me mudei para minha nova residência e me arrumei que as meninas queriam ir no El Tio Molonio, um barzinho aqui perto onde os Erasmus vão na segunda. Fomos lá e ficamos um tempinho, bar legal.

Terça-feira é o dia da mazela Erasmus. Não tem festa, não tem nada. Tive que resolver minhas coisas mais uma vez e fui à Mapfre ver quanto saía o seguro. A surpresa foi boa: 120 euros por 1 ano de seguro, válido para a matrícula da universidade. Ainda assim, tinha que contactar a nave-mãe para ter a autorização e fazer o seguro. Fui mais uma vez à aula de espanhol e voltei para casa. A eslovaca me chamou para ir num bar de tapas [aperitivos, entradas] com uns amigos dela, mas eu não estava nem um pouco a fim. Fiquei em casa para economizar dinheiro e descansar. Jurava que na quarta ia acordar relativamente tarde, mas foi um belo de um engano. Acordei 8h30 para ir no banco pagar a matrícula do espanhol e ir lá [e é longe esse curso] me matricular. Voltando de lá, fui na Mapfre fazer o seguro. A mulher que me atendeu disse que me ligaria ou de tarde ou na quinta de manhã. Beleza, mais uma aula de espanhol e nada do celular. É claro que ela vai me ligar de manhã e me acordar, mas faz parte. Fui pro Juanita Calamidad, o bar das quartas, teve um show DJ + saxofonista que foi bem legal. Voltei num mix de chuva e frio, completado por poças de água inesesperadas no caminho. Provavelmente foi isso que causou a gripe que eu estou agora.

Na quinta, fui realmente acordado pela mulher da Mapfre dizendo que o seguro estava pronto e era só ir lá assinar e pagar. Ainda passei uma meia horinha de preguiça na cama e fui lá. Com essa bronca resolvida, fui na Casa do Estudante para pagar o Integration Weekend. José e David me ajudaram indo lá no banco e depois a gente foi ver a história do som que eles iam alugar para usar nas festas do fim de semana. Passei bem uma hora e meia andando pela cidade e vendo essas coisas, fui na parte de mídia da faculdade, coisa fina. Estúdios de gravação com uma tecnologia invejável, embora não saiba o que eles gravam por lá. De noite fui no Cuore, que demorou MUITO para chegar gente, ao mesmo tempo em que minha gripe ia piorando. Quando deu 2 e pouca eu desisti e voltei para casa.

Chegando aqui, vi que tinha que fazer alguma coisa para melhorar  e poder curtir o Integration Weekend bem. Tomei 1 litro de suco de laranja, uma neosaldina e fui dormir. Uma noite bem perturbada, cheia de sonho, pesadelo, suor e um quase-exorcismo de mim mesmo, mas sobrevivi. Acordei melhor hoje, embora longe de estar 100% e saí para comprar algumas coisas que eu precisava para o fim de semana. Comprei uma calça de esportes da Adidas em promoção [apenas 18 euros] e uma ‘sudadera’ da Champion [25 euros]. Voltei para casa, comprei as cervejas que vou levar e cá estou a 5 minutos de sair de casa. Depois conto como foi o finde.

Ugo.

David Guetta – One Love

Valladolid .4

Onde foi que eu parei mesmo? Já fazia um tempo que eu não escrevia nada por aqui.

Pois bem, na sexta acordei e fui para o Dia de Orientação da Universidad de Valladolid. É o evento em que a responsável pelo setor de relações internacionais dá as informações mais importantes [e 95% das coisas a gente já sabia] e tira algumas dúvidas. Além dela, o grupo de montanhismo da faculdade, o responsável pelo setor de esportes e os representantes da Erasmus Student Network em Valladolid [que falaram das festas e viagens que vão acontecer].Depois disso, fomos a um café que tem na Casa do Estudante [onde aconteceu esse evento] e tinha uns salgadinhos [Cheetos, Ruffles, etc. Nada de coxinha e empadinha :(] e o povo conversando nas mesas. Conheci por lá Soraya, uma mineira que tava mais perdida que cego em tiroteio e ainda não tinha um apartamento. Ela e um italiano iam procurar e perguntaram se eu queria também, disse que sim, mesmo tendo mais esperança no apartamento da Eslovaca que eu tinha falado no Facebook.

Depois da Casa do Estudante, fui pro Alfonso VIII [que foi minha residência até segunda-feira] e esperei Joh chegar lá. Almoçamos no Jardim da Babilônia, um restaurante árabe que por 5 dias seguidos me serviu kebab até eu me estabelecer por aqui. Depois disso, fomos andar e procurar uma mala para Joh, que precisava dela para levar o que ele tinha comprado na viagem e ainda ia comprar em Barcelona. Andamos, andamos e andamos, Joh avistou o lugar onde compraria e depois voltou pro Albergue, pois a gente tinha que se arrumar para o Pub Crawling, evento em que todos saem de bar em bar tomando alguma coisa para conhecer os melhores bares.

Às 21h15 mais ou menos fomos ao lugar marcado e nos reunimos com outros Erasmus. Cada um deu 10 euros para que eles comprassem as bebidas nos bares e organizassem tudo. Não lembro muito bem o nome dos bares, mas a gente foi para uns bem legais. No primeiro, a gente aprendeu como se põe sidra no copo.

Aprenda como se põe sidra no copo

No segundo, a especialidade era um copão cujo nome esqueci de provavelmente uns 600 ou 700 ml com algum drink. Alguns copos foram servidos e outros foram divididos em chupitos [copos de shot] para a competição de que equipe tomava todos os chupitos primeiro [ah sim, no bar da sidra a gente se juntou em 2 grupos para ver quem acabava com a garrafa de sidra primeiro, acabamos perdendo por 2 minutos]. Perdi mais uma vez. A culpa não foi minha e a disputa foi acirrada, mas não deu. Ganhei os óculos rosas que me acompanham nas fotos do Facebook.

O terceiro foi o melhor. De longe foi o que mais deu para beber e se divertir, pois o povo tava muito entrosado. Quando eu perdi no primeiro bar eu ganhei uma coroa de princesa que tratei logo de trocar com um cara chamado Bartek, polonês. O coitado ganhou o apelido de princesa pelo resto da noite [e eu me safei]. Nesse terceiro bar a tradição era os porrones, um tipo de recipiente que parece com alguma ferramenta de alquimia e que se bota algum líquido. Lá tinha vino dulce, cerveja e sangría, ao mesmo tempo em que tentávamos beber com o porrón [acho que acertei o nome, não?] o mais longe possível.

Assim que se bebe o porrón, mas pode beber sozinho também.

O quarto bar foi só para o pit stop. Um pouco de cerveja ou vinho e um croquete, que não comi, de queijo. O quinto, salvo engano, foi um perto lá de casa. O bar era bem pequeno e a gente, quando chegou, tratou de não deixar espaço nem para andar [éramos uns 30]. Tomamos um shot de café com alguma coisa que estava pegando fogo e depois fomos para outro bar, já que era complicado ficar nesse. O sexto era maior e mais espaçoso, mas também não passamos muito tempo. Pegamos um copo mais ou menos do mesmo tamanho que o outro e as pessoas se juntavam com 4 canudos para beber tudo de uma vez só.

O sétimo, e último pelo menos para mim, foi o The Little Bottle, um dos bares ‘oficiais’ da Erasmus. Lá a gente ganhou 1 rodada de tequila grátis e foi dançar e se divertir. Tive um belo fim de noite com Heinekens 2×1.

Os relatos de sábado a terça eu coloco mais tarde, pois são mais rápidos de escrever e no momento eu tenho que resolver algumas coisas. Lembrando que no meu Facebook tem algumas fotos dessa noite que eu não consigo colocar aqui porque mudaram algumas configurações por lá, argh.

Ugo.

Arctic Monkeys – Your Favourite Worst Nightmare

Valladolid .3

As coisas estão engatinhando. Ontem fui na Polícia tentar tirar meu DNI, mas mais uma vez não pude. Agora porque eu tenho que ter uma maldita certidão de nascimento espanhola expedida especificamente para eu tirar esse documento. Tenho que tentar contornar isso, senão vai demorar muito até que o consulado de Salvador envie para o consulado de Recife para meu pai enviar para mim. Argh.

Depois disso, esperei Joh chegar. Pensava que ele ia chegar às 16h, mas isso foi quando ele chegou no aeroporto, que fica a pelo menos 1 hora da cidade itself. Depois que ele chegou, fomos procurar um albergue para ele. Aviso a quem vier aqui de passeio: não há albergue barato aqui. O mais barato que a gente achou foi 30 euros, mas ele só vai pagar 20 porque não tem banheiro no quarto [ou seja, são quase todos hotéis pequenos].

Demoramos muito tempo nessa história e por isso jantamos no meio do caminho numa loja bem mal cuidada da Telepizza. As mesas estavam uma bagunça monstra, mas a gente ignorou e foi comer de qualquer maneira. A pizza estava bem legal e depois de comer fui no banheiro tirar uma água do joelho. Eis que a maldita porta depois de trancada não queria mais se destrancar. Passei pelo menos 5 minutos tentando abrí-la, sem sucesso. E, para completar, estava sem celular, só me restava gritar por lá. Minha sorte foi que a parede não era fechada completamente, então dava para passar por cima. Juntei minhas forças e o pouco de agilidade que tenho e escalei a parede, fazendo desse o primeiro ato ninja meu aqui em Valladolid [espero que seja o único].

Depois, fui para casa enquanto Joh foi para o albergue. O tempo passou, me arrumei e a gente saiu. Iria haver uma festa de integração entre os estudantes Erasmus antigos e os mais novos, mas quando chegamos lá, às 23h30, não tinha ninguém no bar, chamado Cuore. Decidimos dar uma volta e esperar dar a hora certa [o povo só sai de casa a partir da meia noite]. Voltamos lá, necas. Ficamos sentados num banco na praça onde o Cuore fica e decidimos esperar para ver se alguém aparecia. Poucos minutos depois dois franceses [Yoel e Barbara], que também eram novatos por aqui e estavam sem entender por que não tinha ninguém na festa ainda. Conversamos por um tempão e decidimos entrar, mesmo sem ter ninguém, porque estava frio demais. Mais quase 2 horas de conversa e nada do povo chegar. Cada um foi para sua casa, mas valeu a amizade.

Ugo.

The Black Keys – Thickfreakness

Tom

Já leu Tom nº 0, nº 1 e nº 2?

O sono veio fácil, mas o problema foram os sonhos. A tempestade de pensamentos que tinham ocupado a cabeça de Tom esses dias ainda não tinha se dissipado. Porém, parecia que o tempo ia melhorar. Ele viu que podia dar a volta por cima e recuperar o bom humor e o prazer pela vida.

Tom acordou e, instintivamente, foi olhar o seu computador. As pessoas achavam estranho quando ele contava desse hábito, mas era algo tão comum e óbvio para ele: lá tem as horas, as notícias e tudo que lhe interessava ao acordar. Viu que eram quase 10 horas da manhã, o seu horário comum de acordar. Tomou banho, escovou os dentes, ligou o som e começou a trabalhar. Ele ignorava o café da manhã, pois não gostava muito de pão, ovo e essas coisas que se comem no desjejum. Por isso, preferia acordar mais tarde e só se alimentar entre as 12 e as 13 horas.

Ele raramente sentia que seu trabalho era entendiante, afinal era o que ele gostava de fazer, mas, excepcionalmente, não estava nem um pouco a fim de fazer uma análise sobre a eficiência da campanha publicitária da marca X de bebidas. Sua cabeça estava em outro mundo. Tom queria voltar à Ovelha Negra e conhecer aquelas meninas que se divertiam tanto sem se preocupar com os problemas da vida. Talvez elas soubessem a solução para uma vida mais feliz, talvez elas só estivessem expondo um lado da história. Tudo isso era um grande enigma para ele, mas que lhe dava muita vontade de decifrar.

Apesar de sua cabeça se revirando e estando bem mais a fim de pensar mais no fim do seu namoro, Tom era profissional. O que lhe fez ter uma clientela fiel foi sua qualidade. O que lhe fez não ganhar dinheiro foi a sua falta de capacidade em saber como ganhar dinheiro com seu trabalho. Fazia algo que gostava e executava com maestria, mas não sabia a melhor forma de ganhar dinheiro com isso.

Ele sabia que não tinha muito para onde correr, tinha que trabalhar e focar sua cabeça no seu ganha-pão. Continuou fazendo suas pesquisas pela internet e anotando resultados de várias ações publicitárias que foram iniciadas há pouco tempo, mas que necessitavam de resultados, seja para impressionar os chefes, seja porque as ações realmente necessitavam ser mensuradas com tanta velocidade. Não importava para ele, já tinha virado rotina, era só coletar as informações e manter relatórios.

Certo momento, recebeu uma mensagem de Roberta, uma analista de marketing de uma das empresas para a qual Tom fazia seus freelas. Era do jeito que o agradava e que ele mesmo achava que merecia, pois também tinha seus defeitos. Do mesmo jeito que amava música, era quase uma extremista xiita em relação a gêneros musicais. Pouca coisa era pura para ela. Adorava livros, odiava escritores muito mainstream, como gostava de chamá-los. Se o blues, o rock e a música clássica eram os deuses, a música eletrônica e o pop comercial vinham do inferno. Se Dostoiévsky, Fante e Bukowsky eram os reis, J.K. Rowling, Dan Brown e Stephenie Meyer eram aqueles que tentavam destruir o império do conhecimento e do bom senso. Ao mesmo tempo em que seu corpo e sua face transmitiam uma aura gentil e suave, sua personalidade muitas vezes imponente não agradavam a Tom. Ele odiava extremismos.

Quando se conheceram, há quase um ano, a personalidade retraída e mistériosa do analista de mídias sociais quase eremita a atraiu por ser bastante intrigante. Infelizmente, para ela, ele não a deu muita atenção, pois estava num relacionamento com alguém de quem gostava muito. Infelizmente, para ele, Roberta gostava de atingir seus objetivos e demorou para desistir de falar com Tom. Só parou mesmo quando entrou em um relacionamento conturbado com seu ex-chefe, que a tinha cortejado desde que era estagiária. Os meses de insistência fizeram com que Tom pudesse entender a personalidade agitada e imponente dela, mas não era o que ele buscava no momento. Queria paz e futuro com sua namorada.

Hoje, Tom estava solteiro. Há pouco tempo, verdade, mas solteiro. A mensagem que estava no seu smartphone era provocante, mas não podia atender tão urgentemente o chamado, pois tinha que finalizar um relatório justamente para a empresa de Roberta. Ela queria marcar um café com ele, retomar as conversas que tinham parado há vários meses. Agora, os dois estavam solteiros. Tom tinha visto no Facebook dela. A vida social agora tinha seu próprio outdoor. Se chamava rede social, o lugar onde você exibe o que quer, mas muitas vezes não percebe quando passou do limite entre o pessoal e o privado, que deveria ser reservado para o mínimo de pessoas possível. Era a sociedade do exagero, da fama e dos holofotes. E certa parte desta história era o trabalho de Tom, o que o levava sempre a pensar quais motivos faziam as pessoas se expor tanto. Respondeu a ela dizendo hoje não dava, quem sabe amanhã?

Continuou trabalhando e, ansioso, pensava em qual seria a resposta dela. De vez em quando só se tem uma chance.

Valladolid .2

E a brincadeira começou, pelo menos eu acho. Ontem desde que escrevi o .1 fiquei sem fazer nada, apenas vendo seriado e provando a Carlsberg [muito boa] e a Estrella Damm [marromeno]. Nada de interessante a declarar.

Acordei hoje quase às 11 da manhã, um pouco tarde, mas o clima é bom demais para dormir. Fui na polícia solicitar meu DNI [tipo RG espanhol] e fiquei sabendo que tinha que ter uma senha emitida pela internet ou por telefone. Fui ver agora que para quem não tem o DNI e nunca teve, tem que ir lá solicitar pessoalmente [perdi um dia por nada, argh]. Depois disso, fui pela primeira vez à minha faculdade. Passando pelo caminho, vi que tem um parque por lá com 2 quadras de basquete, uns bancos e uns equipamentos de ginástica. Bom saber.

Chegando na faculdade, continuei tão perdido quanto no momento em que tinha saído de casa. Não tem ninguém para ajudar direito e é cada um por si. Certo momento, vi Bela e Rafa por lá e fui falar com elas. Estão tão perdidas quanto eu, mas juntos fica mais fácil encarar a barra. Elas estavam indo para casa almoçar e eu fui junto, mesmo já tendo comido. Aproveitei para ir me atualizando com o que elas já tinha procurado. Nós que escolhemos as cadeiras e temos que fazer combinar com os nossos outros horários, como cursos a parte e possíveis trabalhos. Elas estão no apartamento de Milene, uma paulista que faz enfermagem. Acabei almoçando uns kebabs guiozárabes [quando os kebabs foram esquentados o pão sírio ficou meio ‘cozido’] bem gostosos e, por sugestão delas, fomos na Escola Oficial de Idiomas.

Eu não sabia muito bem se queria fazer curso de espanhol, mas é sempre bom. Quando fiquei sabendo o preço, ficou melhor ainda. Módicos 70 e poucos euros por 1 semestre de aulas [3 meses intensivos de 2h por dia segunda a quinta, com sextas alternadas] e 50 e pouco para estudantes veteranos. Decidimos fazer a prova. Por sorte e coincidência estamos os 3 na mesma turma NI2 [Nível Intermediário 2, que depois do NI1 e antes do Avançado 1]. Até sexta-feira saberemos se a turma vai se consolidar ou não, embora tudo indique que sim. As professoras são bem simpáticas, uma delas engraçadíssima que não conseguia passar mais de 5 minutos sem fazer alguma piadinha e outras duas um pouco mais sérias, mas bem tranquilas. Na prova oral falaram mal do meu portunhol, mas com o tempo vou melhorando.

Lá conhecemos 4 brasileiros, 3 de Recife e 1 de São Paulo, essa paulista, por sinal, mora aqui no Alfonso VIII e me deu algumas dicas interessantes. Dos outros 3, dois fazem engenharia e uma faz direito, galera gente fina. Depois dos testes as meninas foram para o centro e eu voltei com Diego, um dos estudantes de engenharia, que mora aqui perto . A cidade é tão ovo que ele encontrou outra amiga que faz engenharia química com ele e a gente voltou conversando. Quando desci aqui, bem pertinho de casa, consegui me perder, mas foi só 5 minutos andando para me encontrar de novo.

Hoje tem uma festa no Juanita Calamidad, vai ser a primeira de todas, uhul!

Ugo.

The xx – xx

Valladolid .1

Acordei quase às 10. Dormi bem, não fui interrompido e só acordei quando meu corpo achou necessário, ótimo. Sabendo que tinha que fazer aquele reconhecimento de território e ir na parte de Relações Internacionais ver o que eu tinha que fazer por lá. Ganhei uma carteira-cartão de estudante do Santander [com chip e tudo, no nome da Universidad de Valladolid, coisa chique] e um mapa da cidade e dos ônibus dela, agora sim eu poderia ser um turista feliz.

Peguei um ônibus para a Plaza Mayor, que eu acho que é o centro de Valladolid, mas não tenho certeza. E saí andando por lá, para fazer o turismo acidental, que é quando você sai andando sem ter um rumo muito bem definido e vai encontrando as coisas – favorece conhecer a cidade e suas peculiaridades em vez de ficar só vendo os clichês do lugar. Andei feito um condenado, fui pra todos os sentidos da Plaza Mayor até que cheguei no El Corte Inglés [cadeia de lojas de departamento espanhola bem famosa aqui]. Aproveitei para comprar algumas coisas necessárias [na lista, água, coca-cola, desodorante, blablabla] e dar uma olhada no preço das coisas.

Depois, decidi voltar ao meu aposento na canela, e a ‘viagem’ foi bem tranquila. Botei Kings of Convenience no iPod e segui rumo, mesmo sem saber o caminho direito. Saía andando por uma rua, quando esbarrava em alguma coisa importante eu parava para ver o que era e assim fui conhecendo algumas catedrais e praças que não conheceria nem tão cedo.

A temperatura aqui é massa, pelo menos por enquanto. Você anda tranquilamente, sem suar nem sentir frio, é uma delícia. Infelizmente não vai ser assim o ano todo, então resta esperar. Aqui, para minha quase-surpresa, tem gente. Eu pensava que era uma cidade dominada por universitários, mas tem de tudo. As escolas tão cheias de gente, as ruas também são habitadas por pessoas adultas e idosas. Claro que aqui é um pouco diferente, há muitas coisas familiares [inclusive um papel pendurado na porta de um bar dizendo que eles estavam de férias e voltariam de viagem na quinta de noite], bem menos cosmopolitas.

Ainda não conheço 10% da cidade, então não posso dizer muita coisa. Com o tempo vou escrevendo.

Ugo

Kings of Convenience – Quiet is the New Loud