Torrando a cabeça

De vez em quando as coisas não dão certo e o esperado não se realiza. Eu particularmente já sofri bastante disso.

Tudo começa a partir de expectativas que criei sobre a vida. Na verdade, grande parte do que eu faço quando penso na vida é simular cenários e situações, brincar de jogar dados com o destino. Isso não é exatamente uma coisa boa, já me foi dito e eu concordo. A ansiedade que é gerada retroalimenta-se e a cada momento vai nos consumindo progressivamente.

Eu tentei segurar a barra sozinho, acreditando que racionalizando meus problemas chegaria a uma única solução que simplificaria minha vida. Não aconteceu. Ao mesmo passo em que o tempo ia passando, as coisas só iam piorando.

Corri atrás de ajuda. Alguém de confiança, com experiência e intimidade era o que eu precisava, ainda que levasse quase uma hora e meia para ir a uma consulta de quarenta e cinco minutos, aonde eu podia tirar os sapatos, me esparramar no sofá e falar, falar e falar.

Percebi que a minha própria cabeça não era o melhor lugar para eu jogar mues problemas e fazer minhas confissões. Ela já sabia de tudo, não adiantava.

Percebi também que, no meio de todo este turbilhão em que passei nos meus últimos meses, tudo que eu mais precisava era de alguém para me pegar pela mão e me mostrar aonde era o fim do túnel, para me dizer que sim, haveria um momento em que tudo isso acabaria, em que a felicidade reinaria.

Não dá para dizer que tudo aconteceu exatamente como planejado. Tampouco importa, o pior já passou e grande parte do peso que estava em minhas costas desfez-se.

Apesar de sempre estar procurando mais sarna pra me coçar e novos problemas para me atormentar, posso comemorar e dizer que sobrevivi.Além disso, fico feliz em poder dizer que me foi proporcionado um grande aprendizado a ser levado pro resto da vida e que, felizmente ou não, eu ainda terei mais oportunidades de utilizar. É só viver pra ver!

Dedicado a Marta Hazin e Bruno Cavalcanti, caso um dia leiam.

Ugo.

Funcionário do Mês

Trocou o anti-inflamatório por whisky e o escritório por um caderno de anotações. Fez a coisa certa. Agora toda sua angústia estava deixada de lado, ao menos momentaneamente.

Seu corpo ainda se recuperava do acidente e ainda não tinha nem tirado os pontos, mas o remédio tinha acabado e uma bebida de quinta categoria certamente era mais barata e servia para o mesmo propósito.

Deitava em sua cama debruçado sobre seu caderno e escrevia o que vinha em mente. Letras nunca musicadas sobre amores que nunca existiram, cartas de ódio para pessoas distantes e poemas sem a mínima noção de estética. Não se incomodava pelo fato de não ser um grande escritor. Na verdade, a ideia do anonimato, uma garrafa de whisky e seu caderno já o agradavam o suficiente.

Queria largar a gravata que apertava sua garganta, o ambiente que lhe sufocava, a infinidade de tarefas que lhe tirava a paciência. Perguntava-se todo dia em que momento as pessoas decidiram trocar a vontade de viver por mais horas de trabalho na sua conta no final do mês.

Era incrível ver o sacrifício de cada um, mas pior ainda era lembrar que ele tinha tido sua cota de loucura nestes cinco anos de seguradora. Era Tom, o funcionário do mês. Aquele que mais havia entregue sua alma ao mundo dos seguros.

Técnicas de negociação infalíveis, resultados invejáveis e uma depressão crescente. Transfundia sua vida por dinheiro e tornava-se cada vez mais um escravo da rotina. Sem família, sem namorada, sem amigos. Apenas colegas de trabalho e nada mais.

Não foram os flashs ou a luz branca que o fizeram perceber o que estava errado em sua vida, mas sim o momento em que pode, após cinco anos sem férias, deitar em sua cama com um whisky e um caderno e, finalmente, perceber que só vivemos uma vez e o tempo passa muito rápido.