Tom 5

[Já leu Tom nº 0, nº 1, nº 2,  nº3 e nº4? Mudaram algumas coisas, principalmente o 4.]

Tom não sabia cantar. Isso não era novidade e pouco lhe importava no momento. Na verdade, nada importava, nem a música, pois parecia que ele estava perdido no tempo e no espaço ao cantar Careless Whisper, de George Michael, com a maior empolgação da sua vida. Estava eufórico e a música, por si só era depressiva. Não fazia sentido, mas o sax imaginário era mais forte do que a razão. Ele suava e estava feliz, sabia disso. Quando acabou a música, só três pessoas do quase vazio bar aplaudiram: os funcionários-amigos Reginaldo e Joab, e Roberta, que ainda estava sentada quando a música acabou, mas logo se levantou para pedir a vez no microfone. Ela ainda não estava no mesmo nível de transe de Tom, mas as tequilas estavam começando a surtir o efeito que ela queria.

Ela não estava tão animada como Tom. Colocou Sweet Times do Portishead. Era estranho como aquele Karaokê tinha algumas seleções inimagináveis. Deus sabia lá a quem Seu Juan tinha comprado ou como tinha colocado aquelas músicas. Ela sim sabia cantar. Assim que ela começou o refrão “cause nobody loves me… it’s true”, as pessoas começaram a prestar atenção de verdade. O sofrimento na voz dela era belo, acalmou o ânimo de Tom quase instantaneamente. Ela poderia até se chamar Marie ou ate mesmo Beth, de tão sincera que ela estava sendo. Uma aura foi construída no bar como nenhuma vez tinha sido visto. Normalmente pediam para cantar as músicas mais conhecidas, fossem as que tocavam na rádio no momento, fosse as que tinham tocado na rádio há decadas. “Who am I, what and why, cause all I have left is my memories from yesterday, on these sour times…”. As lágrimas escorriam dos olhos dela, mas o que ninguém prestava atenção era que Tom estava mais tocado ainda. A música caiu como uma luva em seus sentimentos que estavam inebriados pelas cervejas após o trabalho.

Ele sentava, olhava para ela. Não tinha outra reação a não ser segurar a sua cerveja com bastante força e segurar o choro. A música acabou. Todos aplaudiram de pé. Ela não tinha muitos motivos para comemorar, mas ficou feliz com a reação positiva. Todos ficavam, Tom sabia. O reconhecimento público é imprescindível para a realização de uma pessoa.

Roberta sentou, eles passaram alguns instantes sem se falar. Sorriram um para o outro, se encararam por mais alguns instantes. Reginaldo chegou com duas cervejas geladas, disse que era o melhor para não prejudicar a garganta e rapidamente se retirou. Tom estava encantado e parecia que nada mais chamaria sua atenção na noite. Roberta estava aliviada e sentia-se bem ao ver que tinham gostado de vê-la cantando. “Isso foi sensacional! Uau, nunca consegui me emocionar num karaokê. Não sei nem o que dizer..”. Tom parou, ia começar a gaguejar e sabia. Roberta abriu um pequeno sorriso e disse: “Tom, muito obrigada pela noite. Era disto que eu estava precisando. Se cuida…”. Roberta se levantou, deu um beijo na testa de Tom e saiu sem nem pagar a conta. Ela era mais rica que Tom, não era esse o problema. Era só a habitual provocação característica dela. Isso atiçava Tom, ele era um cara certinho.

Ainda ficou alguns instantes pensando na vida, quando chegou Reginaldo com a saideira e disse “É bronca… fantástica essa menina canta bem mesmo”. Tom tentou esboçar alguma reação, mas estava difícil. Sabia que era a hora de partir. O bar fechava e a vida tinha que seguir. Levantou-se. Ele não conseguia tirar a música da cabeça “Take a ride, take a shot now, ‘Cause nobody loves me, it’s true, Not like you do”, era quase um feitiço.

Não queira Ugo sem beber: Noite no Conselheiro

[ Na série Não queira Ugo sem beber eu vou escrever sobre alguns lugares em que eu estive/estarei e falarei do ponto de vista de alguém que não bebeu, já que agora eu virei religioso e larguei esse vício. ]

Ontem eu fui pro Conselheiro Bar, que na verdade não é um bar. É uma boate/casa de shows que tem DJs e bandas. Até aí tudo normal, mas acho que só até aí.

É triste ver que o Soho, um dos melhores restaurantes japoneses de Recife [sendo o melhor o Sushi Yoshi], se transformou nesse reductus galerozum superlotado e infernal. A fila de entrada já é entristece, e quando você realmente entra é que percebe que o pior ainda está por vir, sério.

A primeira impressão que eu tive do espaço foi que sobraram uns garçons do antigo restaurante e boa parte dos outros tinha estudado no CBV 1 ano antes de mim. Mas isso é irrelevante, foi só a título de curiosidade mesmo. Cheguei lá dentro e tinha um DJ tocando lembro-lá-o-que, e de tão ‘normal’ que o cara era o som dele passou batido [pelo menos pra mim]. Peguei minha Red Bull [é bom pra evitar passar a noite toda bocejando no meio de um massacre desses] e fiquei ‘curtindo o momento’.

Deu meia hora e o maior aglomerado musical galerozo subiu no palco e começou a tocar. Patusco é uma banda legalzinha, peca por não saberem muito bem o que fazem da vida. Tentaram misturar alguns sambas antigos [muito boas] com ‘ela tá de saia, de bicicletinha/uma mão vai no guidon/e a outra tapando a calcinha’ e aí não dá certo, fica nesse vai e vem de música nova e velha meio ilógico. Ah, sim. Fui no banheiro de lá e voi-la, o ‘ar condicionado’ tava ligado em 32º! Calor da porra lá no salão e botam o ar nessa temperatura?!?!

Conselheiro Bar 05/02/2010

Banheiro do Conselheiro em Clima de Verão

Acabando Patusco [a melhor coisa que tocou ontem], começou a tocar um DJ aí. Vou até procurá-lo pra sugerir que ele mude de nome pra DJ Aí. Isso porque o cara conseguiu mostrar como ser um DJ totalmente anônimo desprovido de qualquer capacidade de ser original, um verdadeiro animalzinho. O cara começou tocando Ivete Sangalo, depois Ivete, e, surpresa, ele tocou 3 músicas seguidas dela. Pensei até que seria 1 hora de tributo a uma das coxas mais grossas do nosso Brasil. Mas não, Ugo tinha que estar errado. Acabando a 3ª música, o nosso gênio das picapes manda um batidão de funk e aí começa o baile. Toca uma, duas, cinco e… Yves LaRock tocando Rise Up??? O cara conseguiu mudar de estilo mais uma vez [e isso tudo aconteceu em meia hora]. Depois da última mudança o cara se aquietou. Botou uns tuntz tuntz daqueles que duram 8 minutos cada e foi assim até a galeroza da Evolughetto [ isso mesmo, pode ler de novo e ficar pensando como eu fui parar lá. E não, eu não fui sequestrado/era refém de algum sequestrador-torturador ] se arrumar no palco.

Teclado, notebook, mil elementos percussivos, baixo de 5 cordas, bateria, violão elétrico e um vocalista. Isso é o que você precisa pra fazer uma swingueira batucada  impiedosa. [ tá até difícil escrever essa parte do post, tá dando uma dor lembrar do som deles ] Esses caras conseguiram uma proeza tão grande que eu acho que até num South by Southwest, um Coachella ou qualquer gigafestival desses do mundo uma banda não consegue. Das 5 primeiras músicas que eles tocaram, 4 o Patusco já tinha executado 1h30 antes. E isso aconteceu até com Morena Tropicana [isso mesmo, versão swingueira de uma música de Alceu Valença], ou seja, o que porra eles tinham na cabeça??  Fato curioso: todo mundo tava vestido de galerozo [ nada anormal até aí pra um show de swingueira ], menos o baixista. O cara tava vestido de MANO. Tava de bermuda, sapato de skatista, ou seja, totalmente a parte da swingueiraland. Eu, hein.

Aí no meio desse show, meus amigos decidem ir embora [ALELUIA, pensei eu, mas o massacre só estava por vir]. A vontade de ir embora era grande, entretanto eu não podia [como assim, Bial?]. A fila estava gigante e eu passei 1h DE RELÓGIO até conseguir pagar o meu cartão. Puta que pariu, fiquei muito irritado com isso. Vou até parar de falar disso aqui, senão eu me estresso mais ainda. Final da história: paguei meu cartão e lavrei.

Moral da história: o lugar é um inferno de gente, os DJs deixam a desejar [principalmente o 2º], Patusco é Patusco, quem vai sabe o que vai ver, e Evolughetto é uma tristeza. Eu não tinha nem 01 cervejinha pra me ajudar a passar por tanta tortura, então foi uma coisa realmente tensa.

R$43 reais e 5 horas depois, conclusão: não volto nessa porra nem tão cedo.

Hoje tem a Sala da Justiça com Nação Zumbi, Eddie e Mart’nália pra lavar a alma, tou precisando.

Ugo.

Chico Science & Nação Zumbi – Da Lama ao Caos

Supersocialização de barzinho.

Num bar, encontramos vários tipos de pessoas diferentes: os mais tímidos, os amigos, os casais, os acasalandos, os amantes e, invariavelmente, os sociais. Os sociais são aqueles que estão lá, sempre sorridentes, conversando com tudo e todos, que sempre se levantam da mesa e saem pra falar com todo mundo, afinal o barzinho é um ótimo lugar para se socializar.

Um tímido não teria iniciativa para ir falar com alguém que não conhecesse bem. Os amigos provavelmente só se levantariam se vissem que a pessoa notou sua presença. Os casais e os acasalandos geralmente pouco estão se importando com os outros e os amantes não querem ser vistos [não sei nem porque eles estariam num barzinho juntos, mââs..]. Os sociais, entretanto, caçam as pessoas para conversar. Há a necessidade de ‘fazer a média’, de renovar e criar contatos e tudo mais.

Esses seres podem manifestar-se de várias formas. Tem sempre aquele cara que é superamigão do garçom e usa o coitado do funcionário do bar como um troféu para mostrar a sua relação com o bar e o quão à vontade com o bar está. Ele chega lá e, quando possível, já vai gritando para o bar todo ver que ele conhece todo mundo que trabalha lá. Ele [raramente ela] senta-se com pose de rei no lugar, pede ‘a de sempre’ e pede pros amigos se sentirem em casa também. Mas ele tá lá, na dele, com os amigos dele.

Pior é o que adora iniciar conversa com as mesas adjacentes: começa a conversar com qualquer pessoa por perto, fala bem alto pra todos ouvirem e fica olhando fixamente em nossos olhos esperando uma risada, uma resposta. O pior disso é que eles geralmente não estão sozinhos [via de regra estão constrangindo os amigos que estão na mesa] e não teriam algum motivo aparente para ficar conversando com os outros. São uns seres meio estranhos que a gente não entende porque eles agem assim, mas não tem muito pra onde correr. Só resta o método Sorria e Concorde® para dispersar esse ser muitas vezes inconveniente, isso quando alguém da nossa mesa não simpatiza com o cara e começa a puxar conversa, porque aí lascou.

Um ser social estranho, mas que existe, é aquele que começa a conversar com uma pessoa e, vendo que tem um amigo dessa pessoa desconhecido, começa a puxar conversa incessantemente pra forçar amizade. De vez em quando dá certo, a pessoa gosta da conversa, o amigo em comum vai embora e os dois viram super amigos em meia hora. Quando não dá certo, rapidamente a pessoa inventa alguma desculpa [banheiro, telefone chamando, hora de tomar o remédio controlado -isso não acontece, que pena-, etc.], porque ficar conversando com um alucinado desses supercarente de amizades nem sempre é uma experiência muito legal.

Há uns que vão pra balcão de bar sozinhos [até House já fez isso, mas de maneira diferente] e começam a puxar conversa com os outros. Eles, em alguns casos, começam fazendo comentários ao bartender/dono do bar [seres que sempre vão dar corda para não perder o cliente]. Muito provavelmente, em pouco tempo encontrarão uma pessoa com a mesma intenção e vão começar o bate-papo, tendo posteriormente a presença de mais novos-amigos e, no final da noite, vão sair como se fossem amigos há vários anos. Essa é a reunião de vários supercarentes [uma pessoa carente, acho eu, não chega ao cúmulo de ir a um bar sozinha procurar amigos desse jeito] que, sabe-se-lá-por que-diabos não têm amigos para acompanhar nessa ida ao bar.

Esses foram os tipos que me vieram à cabeça, se alguém tiver mais ideias…

Ugo.

Zeca Baleiro – O Coração do Homem Bomba Vol. 1&2 [ faltam só algumas semanas pro show dele por aqui, eba!]