Gentleman

– Here, ma’am. Come closer to this side.
– Thanks.
– Where are you going to?
– Me… to Gràcia.
– Oh, me too.

The noise of the train braking and the doors opening, while the announcement system screams on the speakers. The elevator’s door opens.

– Take my arm, I’ll help you.
– You’re such a gentleman. What is your name?
– I’m Ramón, and you?
– Well… it’s better if you call me Mary.
– Then Mary it is. What brings you to Gràcia? Do you live here?
– No, I came to visit my grandson.
– Oh, I see. Erm, I’m sorry… How old is he?
– No problems. He is 7. Was supposed to be in school, but got sick. My daughter asked me to help.
– Can’t say no to that, huh?
– Hehehe, that’s true. But doing this makes me so happy.

The elevator announces system that it has reached the surface.

– Here we are. Closer to the sun once again. Where does he live?
– Not far, close to Verdi street.
– Yes, it’s close. Can I keep you company?
– You don’t need to…
– But can I?
– I can’t say no…
– Then don’t let go of my arm!
– I won’t. And you, what are you doing?
– Me? I was just in the registry delivering some paperwork. Widower life…
– My condolences. This is such a sad moment.
– It was, yes. But it was quite a while ago, now it’s just bureaucracy.

I feel his arm holding me tighter. We stop.

– Careful with the cars. Sometimes there’s crazy people driving in those streets.
– Yes, I’m sorry.
– No need to be, we’re already in a calmer street now. Almost there.
– Good to know. I’m not paying that much attention.
– Yes… unfortunately we’re even too close to the destination. I enjoyed talking to you.
– Oh, what a pity. I also enjoyed, thank you very much.
– Could we have coffee some day?
– I think so, I don’t imagine why we wouldn’t.
– Ok, now I’m going, then.
– But where to? Here, take note of my phone.

The pen dances on a paper while he writes the number.

– Thank you, Mary. It was nice meeting you.
– But you haven’t told me where you’re going now. Don’t you want to stay and have a coffee?
– You should stay with your grandson, he needs your attention. Me… I’m going back to the train station, I have some more stations before home.

Dreadful future

And hatred filled their souls. The origin of it was easy to identify, but their demand was simply impossible to justify. They were blindsighted by what they were told. The words were strong, the angst pulsated strongly from their heads and could be easily felt by their heart.

“What are you fighting against?”, a neutral person asked.

“Against this oppressive government!”, one protestor shouted.

“But what are you fighting for?”, the neutral person replied.

“Progress for our country!”, the protestor shouted again.

“And how do you think you will achieve it?”, the neutral person asked.

“By overthrowing this oppressive government!”, the protestor shouted one more time.

“But this won’t make the country any better. Without government you’ll have anarchy.”, the neutral person said.

“We want the old government back! Military help to ensure the country has discipline and banishes corruption!”, the protestor

 

The protestor marched away while the neutral person stood there without any physical reaction, but lost in his thoughts. “How can we save ourselves by giving our freewill to the ones that had taken it before?”

 

Worse yet, what if this army is composed of blind soldiers that follow blindly the orders of their religious leaders?

 

It wasn’t easy to sleep that night. The future seemed dreadful.

Sobrepujado

Sobrepujado. É uma palavra estranha de se dizer, mas é interessante, é uma palavra com personalidade. Também gosto dela em inglês, “overwhelmed”. Tem várias interpretações para o significado claro dela:

“v.t. Exceder em altura; elevar-se sobre; sobrelevar.
Vencer, dominar, suplantar: sobrepujou o adversário.
Ter a primazia; levar a palma, levar vantagem: o bem público deve sobrejugar os interesses pessoais.
Sobressair, destacar-se: sobrepujar a todos em lealdade.”

tr.v.o·ver·whelmed, o·ver·whelm·ing, o·ver·whelms

1. To surge over and submerge; engulf: waves overwhelming the rocky shoreline.
2.

a. To defeat completely and decisively: Our team overwhelmed the visitors by 40 points.
b. To affect deeply in mind or emotion: Despair overwhelmed me.
3. To present with an excessive amount: They overwhelmed us with expensive gifts.
4. To turn over; upset: The small craft was overwhelmed by the enormous waves.
A minha interpretação é tão alegre como asfixiante. Basicamente é assim que me sinto sobre a vida. Houveram momentos complicados, em que eu passei sobrecarregado entre a universidade e o estagio, escolhendo entre ir para a sala de aula ou ir para o bar, numa tentativa de relaxar a cabeça. Época essa em que eu ainda mal tinha dinheiro para saciar meus vícios e inventar outros.

Passada a tormenta, saindo do túnel quase infindável que me fazia sentir sufocado, me vi diante de um horizonte de possibilidades. Possibilidades essas que provavelmente quase sempre estiveram ao meu redor, mas que não eram contempladas devido à minha situação. Ou que talvez até foram, embora sem a devida atenção.

Agora que posso respirar e entender melhor onde estou e o que sou, me vejo frente a tantas oportunidades, tantos caminhos para tomar, tanta coisa junta, ao mesmo tempo, que me faz sentir… sobrepujado. O mundo é tão grande, há tanta gente para conhecer, tanta coisa nova para fazer.

Acho que durante toda minha vida eu tentei fugir da rotina. Tentei viver diversos mundos de diversas maneiras, fossem elas através de jogos, seriados e livros, fossem elas criadas através da minha própria imaginação e observação ou da minha inquietação constante, pulando de galho em galho buscando sempre uma nova visão da vida.

Será que que querer viver a vida de todas as maneiras possíveis é absurdo e impraticável? Sim, sem dúvidas. Mas pergunto: será que querer viver o máximo possível, evitar a rotina e a repetição, uma maneira tão eufórica de querer viver a vida? Acho que não. Compreendo aqueles que preferem dedicar-se a alguma coisa específica, ou que preferem utilizar seu “tempo vago” para conhecer novas coisas. Infelizmente, isso não se aplica a mim. O previsível é entediaste e agonizante, por mais que haja variações, não vale a pena.
Bukowski disse, apenas dois anos antes de morrer, algo que eu achei interessante. Ele estava vendo uma luta de boxe e o favorito tinha ganhado de seu adversário com tranquilidade. Ele falou:
Bom, que demônios, pagamos para ver exatamente aquilo que esperávamos ver.
É terrível pensar no enorme número de possibilidades que perdemos a cada dia passado. Não sei porque as pessoas vivem na paranoia da perfeição e dedicação japonesa. Talvez eles tenham sido a nação que melhor soube arrebanhar seu povo. Não sem efeitos colaterais: é só procurar para ver o estresse no qual vivem e os distúrbios sociais cada vez mais frequentes nessa geração.

Eu quero ter a liberdade de ser o mestre dos disfarces, capaz de transitar sem ser percebido, de viver mil vidas nesse pouco tempo que tenho aqui.

Ainda assim, acho que as pessoas devem viver a vida da maneira como quiserem e não tenho direito algum de me intrometer. Isto aqui é apenas um desabafo, uma pequena declaração de que, de uma maneira ou outra, “o gigante acordou”, ou pelo menos ele está se espreguiçando.

Ugo.

Torrando a cabeça

De vez em quando as coisas não dão certo e o esperado não se realiza. Eu particularmente já sofri bastante disso.

Tudo começa a partir de expectativas que criei sobre a vida. Na verdade, grande parte do que eu faço quando penso na vida é simular cenários e situações, brincar de jogar dados com o destino. Isso não é exatamente uma coisa boa, já me foi dito e eu concordo. A ansiedade que é gerada retroalimenta-se e a cada momento vai nos consumindo progressivamente.

Eu tentei segurar a barra sozinho, acreditando que racionalizando meus problemas chegaria a uma única solução que simplificaria minha vida. Não aconteceu. Ao mesmo passo em que o tempo ia passando, as coisas só iam piorando.

Corri atrás de ajuda. Alguém de confiança, com experiência e intimidade era o que eu precisava, ainda que levasse quase uma hora e meia para ir a uma consulta de quarenta e cinco minutos, aonde eu podia tirar os sapatos, me esparramar no sofá e falar, falar e falar.

Percebi que a minha própria cabeça não era o melhor lugar para eu jogar mues problemas e fazer minhas confissões. Ela já sabia de tudo, não adiantava.

Percebi também que, no meio de todo este turbilhão em que passei nos meus últimos meses, tudo que eu mais precisava era de alguém para me pegar pela mão e me mostrar aonde era o fim do túnel, para me dizer que sim, haveria um momento em que tudo isso acabaria, em que a felicidade reinaria.

Não dá para dizer que tudo aconteceu exatamente como planejado. Tampouco importa, o pior já passou e grande parte do peso que estava em minhas costas desfez-se.

Apesar de sempre estar procurando mais sarna pra me coçar e novos problemas para me atormentar, posso comemorar e dizer que sobrevivi.Além disso, fico feliz em poder dizer que me foi proporcionado um grande aprendizado a ser levado pro resto da vida e que, felizmente ou não, eu ainda terei mais oportunidades de utilizar. É só viver pra ver!

Dedicado a Marta Hazin e Bruno Cavalcanti, caso um dia leiam.

Ugo.

Funcionário do Mês

Trocou o anti-inflamatório por whisky e o escritório por um caderno de anotações. Fez a coisa certa. Agora toda sua angústia estava deixada de lado, ao menos momentaneamente.

Seu corpo ainda se recuperava do acidente e ainda não tinha nem tirado os pontos, mas o remédio tinha acabado e uma bebida de quinta categoria certamente era mais barata e servia para o mesmo propósito.

Deitava em sua cama debruçado sobre seu caderno e escrevia o que vinha em mente. Letras nunca musicadas sobre amores que nunca existiram, cartas de ódio para pessoas distantes e poemas sem a mínima noção de estética. Não se incomodava pelo fato de não ser um grande escritor. Na verdade, a ideia do anonimato, uma garrafa de whisky e seu caderno já o agradavam o suficiente.

Queria largar a gravata que apertava sua garganta, o ambiente que lhe sufocava, a infinidade de tarefas que lhe tirava a paciência. Perguntava-se todo dia em que momento as pessoas decidiram trocar a vontade de viver por mais horas de trabalho na sua conta no final do mês.

Era incrível ver o sacrifício de cada um, mas pior ainda era lembrar que ele tinha tido sua cota de loucura nestes cinco anos de seguradora. Era Tom, o funcionário do mês. Aquele que mais havia entregue sua alma ao mundo dos seguros.

Técnicas de negociação infalíveis, resultados invejáveis e uma depressão crescente. Transfundia sua vida por dinheiro e tornava-se cada vez mais um escravo da rotina. Sem família, sem namorada, sem amigos. Apenas colegas de trabalho e nada mais.

Não foram os flashs ou a luz branca que o fizeram perceber o que estava errado em sua vida, mas sim o momento em que pode, após cinco anos sem férias, deitar em sua cama com um whisky e um caderno e, finalmente, perceber que só vivemos uma vez e o tempo passa muito rápido.

 

Queria ser escritor

Ele andava chateado com seu trabalho, sentia que não tinha nascido pra isso. A burocracia estava comendo suas entranhas e inflamando seus nervos, a indecisão da sua vida tomava suas noites de sono e o sossego de seus fins de semana. Estava difícil achar uma luz no fim do túnel e ele sabia.

Ainda assim, sonhava em ser escritor. Ficaria em casa ouvindo música e escrevendo tudo que surgia de sua imaginação, talvez viajaria também para outros países para coletar o conteúdo do seu próximo livro. Criaria um blog e uma página no Facebook para se relacionar com suas dezenas de milhares de fãs e seria rico. Best-sellers, o glamour das festas de lançamento de livros e todo o relacionamento com a high society.

Não teria de se preocupar com horários, com obrigações, com chefes nem processos inacabados e inacabáveis. Era só sentar e escrever, sentar e escrever, sentar e escrever… Seria um escritor famoso, mas não tinha ideia nem sobre o que falar.  Não lembrava de algum assunto que conhece bem o suficientemente para abordar ou de alguma história interessante ou engraçada e ficava angustiado por saber o que queria fazer e não poder por incapacidade própria.

Na pausa do cafézinho, saiu do escritório e foi andar na rua, tentando pensar em algo interessante para falar. Viu uma apresentação de rua e em um instante se distraiu dos pensamentos que o torturavam.

Tudo que ele queria era ser escritor, mas não escreveu nenhuma palavra e, no final das contas, nunca foi.

Ugo.

You shook me all night long

Estava perdido em mais uma noite daquelas. O bar estava cheio, as pessoas gritavam, bebiam e dançavam num quase-ritual de sacrifício humano. E estavam todos felizes. Eu tinha meus motivos e compromissos ali, mas, se perguntassem, a resposta seria muito clara: eu preferiria estar em casa. O pior em relação a ser obrigado a ir a algum evento era a ausência de pessoas conhecidas. Talvez isso fosse uma coisa boa – eu era um pouco bipolar.

O desprendimento de um grupo de amigos ou uma acompanhante me permitia observar com mais atenção as pessoas ao meu redor. para cada uma eu já tinha uma análise esteriotipal pronta. Se eu falasse para alguém que fazia isso, a rejeição já viria na expressão facial, mas a concordância viria depois, afinal esteriótipos foram criados por algum motivo. e era esse motivo que me levava a ficar observando pessoas: esteriotipar os outros me permitia ter mais chances de acertar minhas análises e isso me fazia contente.

Os personagens de sempre estavam lá: o cantor que só ia dar uma canja no show principal, mas estava tomando todas, falando mal da música atual e já se preparando para ir a mais uma festa, o escritor de estilo alternativo, que até era bem conhecido entre os seus, apesar de estar lá apenas com a companhia de doses de whisky e goles d’águas, entre outros seres caricatos que estavam sempre lá. Só senti falta da gordinha de cabelo curto pintado de vermelho que sempre estava em frente ao palco, dançando com sua alegria contagiante.

A noite fugiu um pouco do padrão quando uma mulher me chamou à atenção. Não a conhecia, mas tinha ideia de quem ela era. Uma produtora de festas mainstream era tudo que eu sabia sobre ela. Talvez nem ideia eu tinha sobre a jovem senhorita, mas eu já tinha algum esteriótipo formado em minha cabeça. Me despertou a curiosidade saber o que ela fazia em um show de blues. Será que ela gostava ou será que acompanhava seu namorado em mais uma missão de paz para seu relacionamento?

Logo esses pensamentos sumiram da minha mente. Esqueci quem ela era e foquei em como ela estava naquele momento. Devia ter seus 1,75m, quase a minha altura, e eu achava isso bastante imponente por parte dela. Vestia uma blusa de mangas longas um pouco see-through para seu sutiã de renda, uma bermuda curta que contrastava com as mangas longas da blusa e um all-star de algum modelo diferente. Voltando a olhar para cima, eu reparei um lenço enrolado em seu cabelo como um pequeno turbante, complementando ainda mais seu sorriso e sua beleza, suas pele morena-clara e suas pernas bem definidas.

Estava acompanhada de seu namorado e um grupo de amigos de algum clube de motociclismo. A delicadeza do seu visual ia de frente aos piercings, tatuagens e decotes bem expostos de suas amigas. Porém, a cada minuto ela se desprendia mais. Com sua cerveja na mão, dançava de acordo com o ritmo da música de maneira tão natural que me surpreendia. Achava que ela ficaria entediada naquele ambiente, com aquele “som estranho”.

Ela conseguia explorar sua sensualidade de maneira que nunca parecia ser vulgar, era quase uma brincadeira de criança para ela. Aproximava-se de suas amigas, enroscava-se em suas pernas e fixava bem o olhar na sua “refém”. Até agora não encontro nenhuma explicação lógica para alguém querer escapar daquela prisão maravilhosa de suas pernas. Sua intensidade e carisma provavelmente chamaram ainda mais a atenção de das pessoas que estavam por lá, mas ela não se importava, era bem superior a tudo aquilo. No meio de um solo de trompete, cada compasso era um rebolado seu, acompanhando cada momento deste transe musical com leveza e graça no meio de uma música tão intensa. Para ela o tempo e o espaço eram desprezíveis, só o ritmo interessava.

Após os momentos mais intensos, iria voltar aos braços de seu namorado, descansando e o amando. Eu ria comigo mesmo do fato de ele ser menos intenso do que um solo de trompete, isso até me ajudava a se sentir melhor, mesmo destilando inveja e ciúmes por minha boca.

Talvez, no final do dia, todos nós queiramos algo menos intenso e mais reconfortante, como um travesseiro.

Ugo.

[deturpação do cotidiano]

 

Ela dançava

[ e o post número 100, por total coincidência, é um conto. Totalmente a parte da história de Tom, por sinal. ]

Estava triste, o namoro tinha acabado há menos de uma semana e ontem tinha sido dia dos namorados. A noite, especial em vários outros anos, foi das mais melancólicas possíveis. Um vinho barato, mas de bom gosto, Leonard Cohen compunha sua trilha sonora de derrotas amorosas e a Internet lhe mostrava as maiores felicidades e mentiras de todo o ano. Todos se amavam, estavam felizes e surpreendiam-se de maneiras mil. Ela só queria que esse dia e essas lembranças acabassem. Dormiu.

Hoje o dia tinha sido mais tranquilo. Ainda assim tinha que aturar as fotos de todas as comemorações do dia anterior, menos aquelas que ficaram guardadas para sempre ou até algum dos dois revoltar-se por um motivo qualquer e espalhá-las ao mundo. No trabalho, mil cochichos sobre tudo que tinham feito nas noites passadas. Ela ouvia música, trabalhava e esperava o dia acabar.

No final da tarde, duas amigas, que também estavam solteiras, a bombardearam de mensagens, chamando para uma festa que ia ter. Era quinta-feira, normalmente não faria isso num dia de semana, mas realmente precisava.

Foi para casa, tomou um banho quente. Sua cabeça estava na lua, um turbilhão de pensamentos desconexos a tiravam da realidade. Nada que no final das contas fosse importar. Ela sabia que hoje nada importava. Sentia-se quente e acolhida pela água do chuveiro, mas não poderia passar a noite toda assim. Pela primeira vez desejou de verdade ter uma banheira, mas ao mesmo tempo esperava nunca ter de precisar deste tipo de conforto em troca de algo mais natural. Saiu do banho e, não muito depois, já estava vestida e tomava uma taça  de espumante. Esse era dos bons de quem sabia o que queria. Suas amigas chegaram num táxi e ela partiu.

A boate era escura, de ar londrino, e uma música diferente do habitual estava tocando. Ela estranhou num primeiro momento, mas não era isso que importava hoje. Seus olhos visitaram todo o espaço, casais eram poucos, isso a deixou feliz. Viu alguns grupos de amigos, mas nada muito interessante. Foi chamada pelas amigas para pedir sua bebida. As duas amigas já estavam bebericando um espumante, mas não era disso que ela precisava. Tomou uma dose de tequila, não fez cara feia e pediu uma caipirosca de limão para lavar o paladar do gosto forte de álcool.

O tempo foi passando e mais caipiroscas foram tomadas. A conversa girava em torno do mesmo assunto : ex-namorados e as comemorações de ontem. Até o ponto que nada de novo era falado e todas entreolharam-se e não tinham nada a dizer. Cada uma bebia calmamente de seu copo e não faziam nada mais, até que o DJ tocou uma música diferente.

A atmosfera mudou repentinamente. Talvez tenha sido só o efeito do álcool atacando seu corpo. Levantou-se sem dizer nada e começou a dançar. A pista de dança estava cheia, mas ela não se importou. Tinha a impressão de que há anos não fazia algo como isso e que finalmente estava se livrando das algemas do relacionamento que por tanto tempo a restringiram.

Não tinha quem a parasse, dançava com todas as pessoas que a encaravam, mas não deixava chegarem muito perto. Sabia o que estava fazendo, apesar de tudo. Envolveu o ambiente com sua felicidade e seu gingado. Puxou o primeiro rapaz que viu para dançar uma música com aspirações latinas que tinha acabado de começar. O segurou firmemente durante toda a música, resistindo a todas as investidas dele. Fechou a sua apresentação com um grand finale: o beijou com gosto e agressividade, esperou que ele processasse tudo que tinha acontecido nestes poucos segundos de dança. Quando finalmente caiu a ficha, percebeu seu corpo sentindo o prazer e sinalizou que queria mais, ela o dispensou e, finalmente, transcendeu.

Ode à mazela

[mazela, no meu palavreado coloquial remete a preguiça, falta do que fazer, tédio]

Chega mais uma sexta-feira assim como poderia chegar mais um feriado ou recesso do trabalho.  Ela demora, mas chega. E a felicidade que vem anexa é incrível e até revigorante depois de uma cansativa semana, de um cansativo ano.

A primeira vontade que se tem é de fazer tudo que era desejado e não podia ser feito. Principalmente as coisas mais animadas e que nos custam mais energia, festas, beber, jogar, etc. Buscamos a exaustão física e mental.

Porém, para mim, o mais importante de um momento em que estou sem trabalhar, é chegar ao estado de mazela. É como ficar em transe após uma meditação feita por algum monge budista que pratica isso há anos. A mazela, a assim como a meditação, é o momento em que não se tem em mente mais nada. Não se pensa em movimentar, não se pensa em se preocupar ou em querer fazer alguma coisa, no fim das contas, não se pensa.

A mazela é o tudo gerado a partir do nada, a maneira de se relaxar da maneira mais completa possível. De se constatar que não há mais nada a se fazer e ficar contente com isso.

Porém, assim como a meditação, a mazela chega a um ponto que irrita e causa angústia, mas este é o exato momento em que a mente chega à conclusão de que está recuperada e pronta para mais uma exaustiva jornada em busca de gastar cada ponto de energia e fazer o corpo implorar, mais uma vez, pela sua querida mazela.

Ugo.

Ellie Goulding – Lights [ajuda a relaxar]

Ensaio sobre a efemeridade de uma certa juventude

Há pouco mais de 6 meses fui agraciado com a volta de uma amiga do reino dos relacionamentos sérios [estava namorando/encoleirada, reduziu o número de pessoas com quem conversava e consequentemente sumiu até o namoro acabar]. Voltando a conversar e sair com ela, fui introduzido a uma realidade que não era tão explícita para mim antes. Algo tão diferente que nesse tempo me fez pensar e tentar compreender e que ultimamente me rendeu a coragem/vontade/conhecimento-necessário para criar este texto.

Esta juventude em questão se refere a, principalmente, um público entre 17 e 23 anos que habita o cenário LGBT [de maneira mais direcionada as festas Golarrolê, que têm esse foco apesar de uma abordagem mais “leve” e não excludente] e que em grande parte não consegue se identificar com o movimento/ideologia de maneira direta, ao contrário de outras pessoas que conheço que são mais engajadas, que têm uma visão mais acertada sobre esta questão.

São pessoas que, de certa maneira, vivem essas festas [estou generalizando em cima de uma festa, mas tem várias outras similares e isso pode acontecer em qualquer outro canto também] como se fosse Carnaval, onde basicamente ninguém é de ninguém [no mundo dos solteiros e dos relacionamentos abertos]. Eu não tenho o menor problema com isso, o pessoal está sendo feliz e aproveitando a vida como lhes convém, é bastante claro isso.

Porém o que me provoca a cabeça é a questão de que estamos vivendo em uma sociedade bem mais aberta do que nas décadas passadas e que as pessoas têm menos problema em assumir suas posições, gostos e preferências sobre qualquer coisa, mas mesmo assim eu vejo que ainda há uma conexão predominantemente heterossexual no meio de todo esse carnaval bi/pan/hetero/homossexual . Obviamente o mais incerto que se tem a fazer é generalizar e afirmar que todo mundo é de um jeito, porque com certeza ninguém é. O meu ponto é que, pelo que tenho observado nesses breves 6 meses, que podem ser pouco para formar um pensamento sobre isso, mas isto aqui é meu ensaio [O termo ensaio deve-se a Michel de Montaigne (1533-1592), que publicou o seu livro «Les Essais» em 1580, e representa um género literário caracterizado, na sua origem, por um estilo dialogante, intimista, divagante e não sistematizado, baseado na liberdade individual, na reflexão sobre os negócios do mundo, e na busca de um pensamento original] – esse entrelúdio foi grande – o meu ponto é que eu vejo num futuro breve boa parte deste pessoal voltando a ter relacionamentos mais sérios e que serão com o sexo oposto.

Não é um desejo próprio, apesar de preferência própria, mas é o que identifico como tendência neste aspecto. De várias amigas que conheci e conversei sobre recentemente, há um certo pensamento coerente com isso e que algumas outras vezes fica de maneira mais “em cima do muro” com o argumento de que o que importa é a pessoa, independente do sexo. Eu acho isso na verdade, acho isso o mais certo no final das contas. Porém eu acredito que, por razões biológicas/etnológicas/sociológicas/blablabla, acabarão tendendo por esse caminho mais tradicional.

Seria por que é mais fácil? Também. Seria por que é biologicamente certo [favor não entrar na discussão de que há sexo bom em qualquer modalidade, isso não é novidade, mas, de maneira bem simples, homem com homem e mulher com mulher não fazem filhos – isso é biologia, não credo pessoal]? Também. Porém no final das contas eu acho que é mais confortável. Apesar de cada pessoa ser uma pessoa diferente e de cada caso ser um caso, a tendência das personalidades serem definidas também pelo sexo, e daí também o fato de recebermos influências culturais a cada instante e que acabam por nos moldar, faz com que voltemos ao clichê da mulher mais meiga, vaidosa e delicada e do homem mais firme e confiante que acaba por conduzir o relacionamento [meio análogo ao que eu acho que quer dizer modos de macho/modinhas de fêmea]. Não estou falando da história de homem da casa, de prover financeiramente, etc. Estou falando da condução de um relacionamento. Tem casal que troca os “papéis” [nossos esteriótipos culturais]?  Tem e bastante, conheço até alguns casos de submissão quase completa à mulher. De vez em quando é até romântico, mas de vez em quando beira ao ridículo por causa do excesso de poder que é dado à outra pessoa [e excesso é ruim em qualquer caso].

Outra coisa importante de abordar, que eu quase que pulava, mas acho relevante e que ajuda a concluir este ensaio/diálogo-mental, notar que essa idade “jovem-adulta” é uma transição entre a adolescência e à idade adulta, onde apesar de já terem surgido responsabilidades, como o estágio/emprego, contribuir com alguma coisa em casa, nem que seja fazendo as compras do mês, tendo um carro para “cuidar”, ainda é mesclada aquela sensação de rebeldia/liberdade/deus-dará-na-micareta/necessidade-de-experimentar que vem da adolescência.

É uma urgência natural e saudável de se sentir mais livre e de ir atrás do que, se não era proibido, era pelo menos evitado, num exemplo mais simples as bebidas e experimentações sexuais fora do “padrão”. Padrão este que está sendo até mudado. Já vi alguns casos de que as meninas mais novas experimentam mais entre si do que com meninos de verdade, talvez pelo fato de que se sentem mais à vontade e menos expostas no seu próprio grupinho do que “lá fora” com os temíveis meninos [que normalmente estão com mais medo ainda].

É importante experimentar, é importante ir atrás do que se tem interesse e, no final das contas, criar e chegar a uma conclusão do que é o seu gosto pessoal em relação a  tudo na vida, apesar de muitas das coisas acabarem por ser efêmeras e transitórias [assim como eu gostava de axé quando tinha 7 anos] e outras serão verdadeiras e duradouras.

Ugo.

Kudu – Death of the Party [tá pra aparecer um cd mais coerente com essa temática.]