Uma análise sociocultural e ecoturística do Encontro Nacional de Estudantes Erasmus da Espanha 2011 – Ibiza

Esse foi o título da redação que eu entreguei para minha professora de espanhol por ter passado uma semana sem ir à aula. Ela pediu isso para cada um da gente que viajou, uma redação sobre como foi por lá. Eu particularmente gosto de avacalhar-brincar com os títulos, principalmente quando a professora dá essa liberdade e é bastante gente fina. Por sinal, eu poderia até passar mais tempo falando dela, mas vou deixar para um post mais sobre minha vida por aqui, não sobre os acontecimentos em Ibiza.

Elucubrações a parte, mais uma observação: eu odeio reescrever textos que eu não tenho a cópia original. Entreguei o papel para Raquel, a professora, e não tenho outra cópia. Não vou forçar minha mente a reescrever o texto pelo mesmo caminho, até porque aqui tenho mais liberdade e espaço [físico mesmo, porque lá eu tinha uma folha de papel e uma caneta, aqui eu posso escrever até encher o saco ou sentir que o texto já está de bom tamanho]. Fim das observações.

Capital mundial da juventude e das baladas quase inacabáveis [eu que estou dizendo isso, não tenho referências, mas acho coerente], Ibiza é, de certa maneira, uma versão economicamente evoluída de Porto de Galinhas nas férias de dezembro/janeiro e feriadões. Pra falar a verdade, eu ia comparar com Tamandaré, mas não tem cabimento. Tamandaré não tem um ‘estabelecimento’ decente onde as pessoas vão. É casa de alguém, praia, graminha, cidade, blá blá blá [e não me falem do festival, pois festivais são… festivais, não estabelecimentos].  Resumindo, o que eu quero dizer é: lugar com praia que no verão ‘ferve’ de gente atrás de festa, sendo Ibiza trocentas vezes melhor e mais organizado.

No diário da viagem: 8 cansativas horas de ônibus de Valladolid para Valencia  para de lá pegar um barco, com direito a música [um DJ, não o famoso músico espanhol Alceu Valencia] e as pessoas praticando pela primeira vez [de muitas] a socialização via álcool. Eu também, digo logo. A festa estava legal, o povo estava animado, mas fazia um frio da porra. Acabei ficando dentro do navio mesmo boa parte da viagem. Chegamos de madrugada em Ibiza, cada um pro seu quarto e cama! Fim do diário de viagem.

Ibiza é um lugar bonito. Bonito pra cacete! Apesar de só ter ficado pela Platja D’en Bossa, o que eu vi por lá e pelo Google mostram como a praia é bonita. Infelizmente, não fui heroico o suficiente para acordar às 9h depois de ir dormir às 7 para fazer a viagem que meio que ia de ‘cabotagem’ pela ilha vendo as outras praias. Ou isso ou eu ia para a melhor festa de todas, e aí? hahahah. A cidade em si e onde a gente ficou são lugares medianos. Pra falar a verdade, são lugares praianos. Há hotéis, modestos e de luxo, as coisas são organizadas, mas tampouco é a apoteose de Dubai. Nem precisava ser, pra falar a verdade. Os lugares que têm que ser bons são, e ponto final. Nisso, me refiro aos hotéis de luxo, as boates [!!!] e as praias. O resto é detalhe.

No final das contas, no quesito beleza, quem ganha a nota 10 com unanimidade [PORTELA, 10!] é a ilha de Formentera. Alguns meses atrás, quando eu disse que ia para Ibiza, alguma amiga da minha mãe que não lembro bem quem era me mandou ir nessa ilha, disse que era muito bonita, que eu não devia perder, blábláblá. Eu não dei tanta bola, tampouco achava que teria oportunidade de ir lá. Quando soube pela organização que estava inclusa a viagem, eu não perdi a chance [mentira, eu quase que não ia porque na noite manhã anterior o motorista do ônibus atrasou em mais de 40 minutos, deixando a gente morrendo de frio às 6 da manhã sem ter nem o que fazer, então eu quase não fui, mas minhas amigas Rafa, Mal e Bela, que merecem menção honrosa por isso, me fizeram ir] eu sabia que tinha que ir. Putz, o lugar é fantástico. Eu, dois espanhóis, uma albanesa e uma eslovaca, alugamos um samba, uma espécia de buggy totalmente velho e bizarro, mas que no final foi bastante divertido. Os espanhóis foram dirigindo, enquanto a gente foi tirando foto e interagindo com o resto da ‘gangue’ [foram mais de 300 Erasmus invadindo a ilha].

La Manzana Verde

Pegamos a estrada e encontramos lugares realmente paradisíacos. A água de uma cor azul impressionante, coisa de ficar de boca aberta, e olha que eu não sou lá dos maiores apreciadores da beleza da natureza.. a gente parou em duas das praias que tinham por lá, entraram no mar, curtiram o sol [SUNPLUSSS] e tiraram um bocado de fotos, foi realmente bem legal.

Agora, chegando à análise sociocultural… o que esperar de um evento que reúne nada mais que 2000 estudantes universitários europeus na ilha mais agitada do mundo? No meu melhor recifense eu diria: bagaceira. E foi, e foi, mas num bom ótimo sentido. Todos, tirando os organizadores, eram intercambistas em alguma cidade da Espanha, o que já é uma coisa bem mais relaxada, e todos estavam a li para se divertir. Isso é muito bom porque tinha gente da mesma cidade que não se conhecia e que uma viagem de ônibus depois já era best friend! Eu mesmo fiz amizade com… recifenses [tá bom, além dos 4 recifenses, um paulista e um cearense]. É ironia do destino, mas eu estava com muitas saudades de poder falar o quase-dialeto da gente.

Era festa todo dia, praticamente toda hora. No dia da viagem para Formentera estavam todos de ressaca e morrendo de sono, afinal a maioria tinha dormido 2 ou 3 horas se muito, mas já tinha vários heróis segurando sua cerveja, enquanto eu bebia desesperadamente um litro e meio de água e devorava o croissant da salvação. Interessante foi o primeiro dia por lá, em que a programação era livre e as pessoas ficaram na praia e na piscina. Eu fiz o mesmo por certo tempo, mas não tive saco pra passar a tarde toda galetando ao sol, então decidi ir no mercado [caro pra cacete, por sinal] comprar algumas coisas pra fazer o almoço [esqueci de dizer: no quarto do hotel fiquei com 3 amigas recifenses por um problema da organização que me tirou do quarto onde eu supostamente deveria estar]. Quando estava quase tudo pronto, tirei a boa e velha Heineken da geladeira e fiquei na varanda por quase uma hora sentado ouvindo música e pensando na vida. Realmente, naquele momento eu acho que não queria mais nada.

A primeira noite foi a mais louca de todas com total e absoluta certeza. O cenário foi a Eden, nome tudo a ver com a boate que, além de uma área que era cheia de jatos de água, foi palco para um bizarro, interessante e engraçado concurso de striptease universitário. Um cidadão chegou a ficar nu só com um chapéu cobrindo o seu ‘palhaço’ e uma cidadã chegou a tirar o sutiã, fazendo o famigerado handbra. Disseram até que rolou striptease profissional, mas acho que foi na hora que eu saí da boate pra procurar comida. Ah sim, fato interessante: paguei 5 euros numa garrafa de água de 200 ou 250ml [isso mesmo, R$12,50], doeu. A maior surpresa da noite, entretanto, foi o fato de que estávamos um pouco molhados e que o filho de um harém do motorista do ônibus nos deixou mais de 40 minutos esperando no meio da rua. Todos se tremendo, afinal estávamos em Ibiza, quem iria levar casaco? Enfim.. deixa pra lá.

Segundo dia, viagem pra Formentera, tudo muito legal. Novas amizades através das viagens pela estrada e pela praia, tudo muito legal mesmo. De noite marchamos para a Privilege, maior boate do mundo com capacidade para 10 mil pessoas. Uma certa parte da boate estava fechada, obviamente, imagina a gente lotando 20% do espaço total, ia dar uma sensação de vazio digna de alguns shows mal produzidos de Recife. O tema era School Party e eu acho que foi a festa em que as pessoas estavam mais bonitas, as fotos provam, embora eu tenha me prometido não citar nomes nem mostrar fotos. Mais uma vez, rolou um striptease, e uma live performance de uma senhorita que eu não tenho a mínima ideia cantando junto às batidas do DJ, isso é bom pra variar, saber que tem alguém correndo pra um lado e pro outro, hehehe.

Alguns heróis foram no terceiro dia de manhã visitar as callas/praias de Ibiza, eu não. Acordei lá pra uma ou duas da tarde porque sabia que o dia seria longo, mas pouco tinha noção de que seria um dos melhores dias da minha vida. Fomos para um lugar chamado Gala Night, embora tenhamos ido à tarde, que de certa maneira me lembrava Aldeia. Era um lugar bem cheio de natureza que por uma hora teve a festa da espuma. Nosso ônibus chegou quando faltava menos de 10 minutos para acabar, tsc tsc. O espaço era enorme, tinha duas super piscinas, uma em que era permitido entrar, outra que não, DJs, churrasco [à espanhola , nunca vai se comparar com um churrasco brasileiro] e todo mundo espalhado por lá. Uma certa pessoa conseguiu jogar a boia de salva-vidas na piscina e ser expulso de lá, mas na maior cara de pau voltou e ainda furtou uma camisa de uma campanha de ‘responsible party’ que estava rolando por lá, entregando bafômetros e tal. Isso rendeu minha tarde de tanto que eu ri.

De noite fomos para a Es Paradis, ah, a Es Paradis… confesso que depois da Gala Night tomei uns 2 shots de tequila na tentativa de me manter o pique, mas quando cheguei lá eu tava meio desanimado. Por sorte, um dos organizadores saiu gritando pra galera que tava sentada num lugar lá da boate para que todos se animassem e não ficassem mazelando. Foi esse empurrão que eu precisava para entrar na vibe da festa e depois disso eu não parei. A música era incrível, o lugar também e quando deu 4 da manhã começou de verdade a Water Party, da qual eles são famosos. A área central lá começou a se encher de água, que estava gelada pra cacete, mas depois de um certo tempo deu pra ir se acostumando [mentira]. A concentração de gente tava tão grande que tinham ‘ondas’, de minuto em minuto vinha uma enxurrada de gente em sua direção, derrubando a galera e possibilitando mãos-bobas a granel. Eu peguei 2 copos de plástico [plástico do bom, não de festinha] e ficava enchendo de água e tacando na cabeça do povo, foi divertido, heheheh. A galera, no embalo alcóolico da festa não largou os estudos:  devo dizer que vi por lá até gente praticando conceitos de ginecologia tátil avançada…  O que eu quero dizer sobre essa noite, no final das contas é até difícil descrever de maneira que fique legal e empolgante, então de certa maneira esse vídeo aqui ajuda a explicar. Foi uma das noites mais divertidas da minha vida, a música tava perfeita, as pessoas estavam empolgadas [algumas até demais] e eu saí de lá com um sorriso no rosto difícil de tirar a cada vez que falo da Water Party da Es Paradis, e como me arrependo de não ter comprado uma camisa de lá! Observação importante: provavelmente foi essa festa que causou a gripe de pelo menos metade da ‘federação’ de Valladolid, e também das outras cidades.

Ah, Es Paradis...

No último dia a festa era na nossa Platja D’en Bossa, ou seja, não precisávamos de ônibus e cada um podia ir na hora que quisesse. De tarde o combinado era ir para um lugar da praia reunir todos os que estivessem por lá e fazer um grande botellón [gente reunida bebendo fora de um bar], e fizemos. Eu levei um copo de um litro do Burger King que continha a lendária ‘poção mágica’: 7 doses de tequila, 5 de licor de laranja, 3 de licor de maçã e 5 limões. O problema foi que eu a repeti, o que gerou uma certa amnésia e me fez acordar na minha cama [bêbado tem GPS]. Descobri até que passei meia hora conversando com uma amiga minha sem ela ter noção de que eu estava no piloto automático.. rendeu vários risos depois. Para minha sorte, acordei bem na hora de me arrumar para ir para a festa de despedida. Me fizeram um sanduba da salvação e fomos para a Space, que eu pensava que seria a melhor boate no quesito música. Acontece que o DJ era o mesmo da primeira festa, então não mudou lá muita coisa no repertório. Ah sim: era a Masquerade Party. Minha máscara era a mais barata e bizarra que tinha por lá. Comprei junto a um kit zorro para crianças, que vinha com duas máscaras de plástico e duas espadas de plástico extremamente bizarras. O elástico, obviamente, não aguentou minha cabeça, mas aí fui engenhoso: peguei um headphone seboso que a Renfe me deu na viagem de trem Madrid-Valladolid e cortei, fazendo com que o fio ficasse do tamanho certo. Voltando à festa: com certeza eu não estava com o pique de fazer um super festão. Já tinham sido 3 dias seguidos de chegar no hotel às 7, dormir e já sair correndo, soma-se isso à ressaca e o resultado é um Ugo cansado. Ainda me diverti bastante com os recifenses e voltei perto das 4 da manhã, sabendo que tinha que acordar às 9 para arrumar o quarto [hotel preguiçoso, você tem que deixar as coisas organizadas ou eles não devolvem a fiança!!].

Fizemos a arrumação mais bizarra do planeta, estávamos todos cansados e começando a gripar. Conseguimos nossa fiança e pegamos o ônibus para pegar o navio para pegar o ônibus para pegar o táxi para chegar em casa! Pequena troca de meios de transporte, hein? Essa viagenzinha foi de meio dia até 3 da manhã, momento em que gloriosamente cheguei aqui, feliz por ter voltado vivo, estressado por estar gripado e cansado.

Isso foi Ibiza… eu acho.

Ugo.

Fujiya & Miyagi – Lightbulbs [vanilla, strawberry, knickerbockers glory]

João Bobo e Maria Doida

[ ignorem, por favor: {EAV_BLOG_VER:7e68eb1f27b36bae} ]

Desde que cheguei em Valladolid, não passei mais mais de 2 semanas sem ir no Jardin de Estambul [como está grafado lá], uma lanchonete que se chama de restaurante turco [eles têm 3 tipos de prato: kebab, döner e lahmacun, que são quase a mesma coisa, além de salada e crepes, o resto é variação dos ingredientes] e que fica a uns 10 minutos da minha casa.  Eu não tenho certeza se ele é o melhor, o mais perto ou o mais barato, mas eu sempre fui nele e nunca me arrependi.

Sendo cliente fiel há mais de 3 meses, aparecendo lá quase duas vezes por semana, eu me acostumei com os cozinheiros/atendentes/caixas/garçons que geralmente estão quando eu vou. Os apelidei mentalmente de João Bobo, um cara alto de uns quase 40 anos e meio gordinho, e Maria Doida, uma mulher de uns 30 e pouco que provavelmente tem origem turca, tem o cabelo pintado de um quase-ruivo estranho e, como o nome diz, é meio doida..

João Bobo é um cara razoavelmente simpático e que estava lá para me acudir nos momentos de vício em kebab, quando eu passei um mês ou mais indo lá duas vezes por semana. A frequência era tanto que ele já sabia o que eu ia pedir e eu acabei achando isso legal. Sabe-se lá o que passou na mafia gastronômica turca, João Bobo não está mais por lá. Talvez esteja em outro restaurante, pois o Jardin tem outras duas filiais, ou se ele foi morto. Talvez ele até tenha tirado férias, vai saber?

Maria Doida é doida. Não tem muito o que dizer. Tem um cara, meio baixinho, ator-de-Bollywood-like que é como se fosse o gerente/capataz da máfia turca e que fica rodando o bairro e visitando cada ‘Jardin’. Dia desses Maria tava de bobeira na porta do restaurante sentada numa cadeira fumando, trabalhava sozinha, e o cara foi encher o saco dela. Era apenas o cigarette break da coitada, todos os clientes tinham sido atendidos, não ia fazer mal algum. Ela voltou ao balcão e, quando ele se virou e foi embora, ficou dando dedada e cara feia pra ele. Daí que tirei o nome Maria Doida. Pensei até que ela fosse se demitir/ser demitida, mas até agora está vingando por lá.

O último fato curioso foi o fato de que eu sempre preço o Durum [um kebab “lanche”] e uma porção de batatas fritas pra levar pra casa, mas por mais uns 60 centimos dá pra comprar uma lata de Coca-Cola, coisa que eu nunca faço porque não vale a pena. A louca, ontem, me deu uma lata de graça. Por conta da casa, disse ela. Fiquei besta, mas feliz! Não sei se foi o reconhecimento dela por eu ser um cliente assíduo ou se foi o aparente desprezo pelo restaurante, mas ganhei minha latinha. Viva Maria!

Continuarei um cliente fiel ao Jardin de Estambul, até que Viena nos separe.

Ugo.

Tom Waits – Closing Time [o que dizer?]