Antropologia Musical

Esse meu último fim de semana foi uma maratona musical. Sexta-feira teve a noite do metal do Abril pro Rock, sábado teve a noite rock/alternativa do mesmo evento e ontem foi o “Encontro do Rock”, que reuniu a adolescência alternativa/hardcore/popcore de Recife.

Difícil encontrar alguém que tenha feito o mesmo, mas eu fiz. Primeiro porque eu gosto do Abril pro Rock e no Encontro do Rock tocou a Woohoo, banda que eu empresario/produzo/faço um bocado de coisa. Segundo porque é uma experiência bastante interessante encontrar vários tipos de gente diferente em apenas 3 dias, além de encontrar os amigos, claro.

Sexta-feira

A sexta-feira do metal do mal e do punk rock me surpreendeu por ter aparecido uma galera muito jovem, principalmente na rodinha de Agent Orange, a única banda que eu vi e realmente gostei. As outras apostas eram The Mullet Monster Mafia, que eu cheguei atrasado e não vi, e Terra Prima, mas eu tava por fora e não achei tão legal o som deles. É engraçado ver a galera com aquelas roupas de couro bem estranhas que eu não sei onde compram e todo mundo vestido de preto.. eu tava com a camisa do APR de 2006, que era no estilo da camisa da seleção brasileira, fazendo o contraste com a galera dark.

É bom ver também que ao contrário do que muita gente pensa, essa galera é bastante gente fina e unida. É mais fácil ver gente brigando de verdade em show de axé por causa da mulher alheia do que num show de metal. De vez em quando aparecem uns zés ruelas no meio da rodinha querendo avacalhar ou estilando porque levou um pipoco nas costas, mas tá na rodinha é pra aguentar isso mesmo.

Haviam muitos casais, gente da mais bonita à mais feia. Ou seja, são pessoas normais que o povo que não conhece de perto faz questão de esteriotipar. Coisa de ignorante mesmo.

Sábado

O sábado foi o dia da alternatividade. Aquele dia em que você chega no festival sem conhecer boa parte das bandas e vai lá pra ser surpreendido. Quem me surpreendeu mais foi Plástico Lunar, Instituto Mexicano del Sonido e Afrika Bambaata. Quem não era surpresa e botou quente foi 3namassa, muito bom o show deles. A Nação Zumbi e todos seus projetos paralelos (Los Sebozos Postizos, Maquinado e 3namassa) conseguem atingir uma qualidade musical que deveria dar uma inveja pra a maioria dos músicos, nacionais e internacionais.

O público era diferente, ainda que tivessem aparecido alguns headbangers com camisas do Iron Maiden, Angra, etc. O que predominava mesmo eram as camisas xadrez, uns penteados meio estranhos e muitos, mas muitos all-stars. É um estilo diferente e que me agrada, apesar de eu nunca estar vestido desse jeito. A noite que começou bem pesada cheia de bandas de rock foi se amenizando e virando mais dançante. 3namassa fez uma legião de lésbicas começar um furor orgiático por lá que só parou quando o show de Pato Fu acabou. Essa galera com certeza não tava na sexta-feira.

A incrível presença de palco do vocalista Camilo Lara do Instituto Mexicano del Sonido e o som de Afrika Bambaata conseguiram fazer a galera se mexer de verdade. Do nada o que era uma festa de rock virou uma micareta que alternou do indie ao pop numa tranquilidade incrível.  Muita gente se aproximou do palco nesses 2 shows, foi aí que eu vi que acertaram na escolha de 2 atrações que não eram de tanto conhecimento do público (Afrika Bambaata é tido como uma lenda, mas não é uma lenda pop, e sim uma lenda underground do underground atualmente). Muita gente loucamente dançando lá os talentosos e os que tavam beirando o ridículo. A festa tava feita, e isso foi legal.

Pato Fu começou e game over pra mim. Não conheço quase nada deles, a banda é legal, entrosada e animou os fãs, eu já estava morto. Sabia que no outro dia era mais maratona e que tinha que me conservar um pouco.

Domingo

Acordei no domingo só pensando na Woohoo, porque a gente faz pouquíssimos shows (gastar dinheiro com os músicos contratados  é uma realidade triste). Cheguei cedinho no Downtown Pub pra dar uma olhada nas bandas que iam tocar antes… nada demais. Gente aprendendo a tocar, fazendo muito cover e praticamente tocando pros amigos. Isso é o começo de qualquer banda, com a Woohoo já foi e ainda é um pouco assim.

O público 98% abaixo dos 20 anos. Roupas de surf em sua maioria, Quicksilver, Reef, Bali, Rota do Mar e por aí vai. Bonés  pra todos os lados, cabelos dos mais estranhos possíveis [essa moda emo de puxar o cabelo e botar meia na cabeça tá foda],. É assim o mundo dos que não se conformam em viver no estilo popular de ser.

Foi um evento feliz porque a organização foi muito boa, apesar de inexperiente em certos momentos e porque as bandas que tavam lá tocavam com vontade, não foram ao palco com a noite ganha, tinham que conquistar o público que na maioria das vezes estava lá só para ver a banda de seus amigos. Tirando a vida dos outros, também foi uma tarde/noite legal. A Woohoo fez um show muito bom e tinha muitos amigos pelo Downtown para conversar e tirar onda.

O fim de semana, apesar de extenso e cansativo foi bastante legal. Deu pra ver várias tribos, seja dos metaleiros, dos indies ou dos emos, convivendo. É assim que a gente vai aprendendo a respeitar as diferenças. Espero que um dia todos consigam fazer isso.

Ugo.

Reel Big Fish – Our live album is better than your live album

De onde surge essa galera?

Voltei agora da primeira noite do bom e velho Abril pro Rock. Além de ser um grande evento em relação às bandas, é uma grande experiência antropológica, principalmente na noite do metal! Tentei vivenciar todos os ângulos que se pode ter num festival desse porte. Vi o show de perto, vi de longe, fui no meio da galera, estive o show todo do Matanza no meio da rodinha.

Pois bem, independente do lugar em que me encontrava, meus olhos estavam prestando atenção a todos que se encontravam ao meu redor. E pense numa coisa legal fazer isso! Eu nunca tinha tido a chance de ver tanta gente bizarra junta. Vão dizer que eu nunca fui a um show de metal na minha vida. Tá bom que eu não sou aquele quase-ancião que viu o Black Sabbath lançar o seu primeiro álbum, mas posso dizer que nos últimos 3 ou 4 anos eu tenho ido a 90% dos shows mais importantes de metal que aconteceram aqui por Recife. Por isso, eu posso dizer que já sabia o que esperar da galera que ia aparecer, maaas…

Não tenho condições de fazer um relato seguindo uma linha do tempo correta, até porque não estava segurando um maldito caderninho de anotações, tinha nem pra quê. As primeiras observações não foram realizadas na entrada, até porque tava tudo tranquilo por lá. Aqueles carros de som tocando as músicas que viriam a seguir e a galera no bom e velho warm up.

Infelizmente, perdi o show da AMP e não lembro muito bem da galera que tava vendo o show da Black Drawing Chalks. A brincadeira começou mesmo no show do Matanza. Uma pessoa que vê um show deles tem que estar disposta a entrar na rodinha e se divertir. Paz não é uma palavra que frequente o dicionário do vocalista Jimmy London e quem tá lá no meio certamente não tá procurando por isso. Eu também não esperava encontrar Mahatma Gandhi ou sua reencarnação pregando o peace and love por lá e eu estava a fim de aliviar um pouco do stress desse dia-a-dia sofrido de concurseiro.

E lá no meio daquele ciclone de alucinados se estapeando, eu comecei a perceber que tava mais preocupado com olhar pra galera do que necessariamente atingir alguém. E pude concluir: quanta gente estranha estava por lá. Desde os habituais carecas de suspensório que parecem ser órfãos de Nasi, do IRA!, passando pelo estereótipo do metaleiro-não-muito-extremo recifense: o cara de calça jeans escura, sapato normal e uma camisa preta de alguma banda. Além deles, tinha aquela galera que se empolga demais e calça bota, bota calça do exército [eu tinha que fazer essa velha piada do ‘por que bota a gente calça e calça a gente bota?’ HAHA], camisa de alguma banda de metal extremo do mal, além daquelas toneladas de coleiras, pulseiras, spikes e crucifixos invertidos que foram imediatamente vetados pela segurança do evento. O que mais me chamou a atenção lá na rodinha não foi nem a aparência do povo, e sim o comportamento dessa galera. Enquanto os órfãos-de-Nasi marchavam dando murros cavalares a la Zangief do Street Fighter, sempre revidando com o triplo da força aqueles que ousavam triscar neles, os caras que aproveitaram aqueles coturnos do período em que passaram no CPOR saltavam alucinadamente tentando derrubar algumas das estátuas móveis que tavam por lá. Além desse duelo dos robocops contra os seres que tentavam ser o mais dark possíveis, havia um bando de efedepê que, acabada a música, naqueles 15 segundos que o cara tem para relaxar e respirar, chegavam empurrando a pessoa por trás. Pra que isso? ¬¬

Passando da parte da guerra, toda hora que eu ia mais pra trás pra comprar uma cerveja ou mesmo só pra relaxar, eu encontrava alguma pessoa, digamos… ‘notável’. Vi uns caras que fizeram com que eu percebesse uma coisa: não sou o cara mais feio de Recife. Tem gente que se esforça pra disfarçar a feiura, mas em contrapartida tem uns seres do pântano que fazem o maior esforço possível para chegar à feiura de Lemmy, nosso amigo do Motörhead. Alguns caras chegavam a causar aquele questionamento: que tipo de adubo/fertilizante/shampoo esses caras usaram pra fazer crescerem essas moitas que lembram, de vez em quando, o fantasma jamaicano, isso quando não lembravam um caboclo de lança. Mas vai ver a inspiração deles vinha do carnaval, já que a cidade histórica era ali do lado mesmo.

Não lembro se tenho mais algum aspecto a ressaltar sobre esse assunto, mas pra mim fica a observação que os metaleiros cada vez superam-se mais no quesito feiura/esquisitisse. Tenham medo.

Ugo.

The Keith – Noiseless [eles estarão amanhã rockeando o Abril pro Rock. Certeza!]